Um sonho na noite de Natal

Um sonho na noite de Natal

Quando criança, poucas vezes ganhei presentes de Papai Noel.
Chegava a noite de Natal e quase sempre a espera ansiosa terminava em frustração. O remédio era ir dormir conformado, com uma lágrima de tristeza nos olhos. Ficava apenas a lembrança da ceia natalina, muito simples, onde o presente era a família reunida, unida por um forte sentimento de amor.
O tempo passou, a vida melhorou, os natais se sucederam e os presentes vieram a fazer parte daquelas noites festivas. Não faltavam a árvore toda reluzente, a ceia regada a vinhos, iguarias e as brincadeiras de amigo secreto.
A despeito de tudo isso, uma inquietude inexplicável me atormentava justamente na noite de Natal. Familiares e amigos notavam essa mal disfarçada tristeza em meu semblante.
Questionado a respeito, eu sempre encontrava alguma resposta pouco convincente, diga-se de passagem.
Na verdade, aquele clima festivo me parecia cada vez mais vazio de significado. Já não me sensibilizava como antes.
Certa noite, após a celebração natalina, fui dormir com uma agoniante sensação de vazio. E, tive um sonho. Sonhei que me encontrava no meio de uma escuridão profunda e no meio dela apareceu uma estrela cintilante. E da estrela uma voz a mim se dirigia. E eu a ouvia atentamente:
“O Natal perdeu seu sentido mais profundo. Tornou-se uma celebração exterior, materialista, consumista. Usurparam sua mensagem original, transcendente e libertadora. Restou apenas o presépio, cujo simbolismo poucos entendem. Seu significado, tanto quanto o do Natal, é interno, místico. Seus fatos e personagens representam estados de consciência e etapas progressivas na vivência de um Cristianismo autêntico. A gruta de Belém simboliza o coração humano, onde o Cristo deve nascer, na mais absoluta simplicidade e despojamento. Ali, no silêncio e na escuridão da noite, no meio do `nada`, o Verbo se faz carne. Naquela escuridão só brilha a Estrela de Belém”.
De súbito, despertei do sonho. Permaneci pensativo durante um bom tempo. Por fim, lembrei-me daquela frase de Angelus Silesius: “Ainda que Cristo nasça mil vezes em Belém, se não nascer em teu coração tua alma seguirá extraviada”.
Foi apenas um sonho, mas o bastante para aquietar-me o coração.

Por Gilberto Silos

Maria com Jesus e os anjos – Botticelli

Sobre Gilberto Silos 229 Artigos
Gilberto Silos, natural de São José do Rio Pardo - SP, é autodidata, poeta e escritor. Participou de algumas antologias e foi colunista de alguns jornais de São José dos Campos, cidade onde reside. Comentarista da Rádio TV Imprensa. Ativista ambiental e em defesa dos direitos da criança e do idoso. Apaixonado por música, literatura, cinema e esoterismo. Tem filhas e netos. Já plantou muitas árvores, mas está devendo o livro.

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