Dentro e fora do Jardim
A ideia de que num passado remotíssimo da evolução humana vivíamos num “paraíso”, permeia os ensinamentos de várias religiões. Essa ideia também é objeto de estudos de mitólogos, psicólogos e filósofos esotéricos, como Joseph Campbell, Mircea Eliade, Pierre Weil e Max Heindel.
Campbell, certa vez, em entrevista concedida ao apresentador de televisão Bill Noyers, afirmou: “Voltar ao “Jardim” é o objetivo de muitas religiões”. Essa declaração surpreendeu os líderes religiosos apegados a dogmas e à interpretação literal da Bíblia. Afinal, que Jardim é esse?
Era uma referência ao bíblico Jardim do Éden, o paraíso, donde os seres humanos (simbolizados por Adão e Eva) foram expulsos por pecarem contra as determinações de Jeová. Dali em diante passaram a conhecer o sofrimento e todas as limitações decorrentes de sua desobediência. Foi a “Queda” do homem.
Há relatos daquele “paraíso perdido” e da Queda, não só no cristianismo mas também nas culturas e tradições de civilizações antigas assim como de povos contemporâneos.
Numa síntese, a mais objetiva possível, Joseph Campbell afirma que as causas da Queda e da perda da condição paradisíaca é a consequência do ego humano sentir-se separado dos demais. E, como extensão desse sentimento de separatividade, buscar sempre a satisfação dos interesses do “eu” e do “meu”, agindo na contramão do processo criativo de que somos expressões individualizadas. Em outras palavras, acabamos por usar nossa prerrogativa do livre arbítrio tentando dirigir o “curso do rio” do nosso jeito, sem o respaldo de uma Sabedoria capaz de indicar o rumo certo. Assim, fomos mantidos fora do Jardim.
Para as várias denominações do cristianismo popular, voltar ao Paraíso é uma possibilidade futura oferecida aos crentes, condicionada a suas condutas ou fé aqui neste mundo.
Para Campbell, estamos fora do Jardim, alienados do esquema original da evolução. O retorno a essa elevada condição depende do estado de consciência de cada pessoa, por meio de persistentes esforços. Para ele, “o estado imaculado da mente e das emoções é acessível a todo ser humano. Podemos prová-lo em algum momento de nossa vida, quando nos permitimos estar plenamente “despertos” para a realidade do momento presente”. “A diferença entre o viver comum de todos os dias e o vivenciar tais momentos é o “estar fora ou dentro do Jardim”. Isso deve ser encarado como uma missão possível. Mas, é necessário vencer a natureza egóica que suscita o medo e o desejo e elevar-se conscientemente acima da influência dos pares de opostos. É um bom caminho rumo à Transcendência.
O mito do Paraíso Perdido é a raiz profunda da aspiração humana pela felicidade, em todos os tempos e lugares.
“Há uma voz que não usa palavras. Escute-a”. (Rumi)
Por Gilberto Silos
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