2001 – Uma Odisseia no Espaço
Por Gustavo Souza Silva
Muito mais que uma odisseia pelo espaço, 2001 é uma jornada pela história do Homem – desde uma época longínqua, quando descobriu o fogo, até a era espacial.
Fascinado pela astronomia desde criança, Arthur C. Clarke associou-se ao digníssimo Stanley Kubrick com a criação do roteiro de 2001 – Uma Odisséia no Espaço, talvez o auxiliando na visão astronômica da produção cinematográfica, definindo como abordá-la e acredito que dando ideias para o diretor. Este que, perfeccionista, procurava um longa-metragem esplendoroso e abstrato, contendo não as respostas, mas sim as perguntas que fizera junto com Arhur na confecção da história. Desta forma, eles optaram por manter o filme com aquele tom de mistério no final – tom que também há no romance, mas amenizado – e expandir a história num romance, deixando na escrita aquilo que Stanley quis mostrar de forma abstrata. Mas enfim, vamos nos ater ao romance – que já adiantando, digo que é tão maravilhoso quanto o longa.
Tal obra é separada em seis partes, cada uma contendo uma parte diferente da trama, e nenhuma mais importante que a outra. Pois todas se completam de uma forma incrível, mesmo as que parecem improváveis de possuir uma ligação com a outra. As seis partes as quais ele é dividido são separadas também em três focos narrativos diferentes: Aquele-Que-Vigia-a-Lua, o líder de um clã de primatas de antes dos primórdios da humanidade. Heywood Floyd, o presidente do Conselho Nacional de Astronáutica. E David Bowman, um astronauta veterano. Cada qual relacionado um ao outro de alguma forma, por incrível que pareça.
Toda a trama da obra tem como o ponto central um misterioso monólito preto de material desconhecido, que surge pela primeira vez há três bilhões de anos para os Homens-Primatas, parte da história que é relatada de forma magnífica. Uma narrativa sem nenhum diálogo, mas dotada de uma narrativa de encher os olhos de tão bela, mostrando com delicadeza os primeiros passos da evolução, a aurora do Homem. Tal parte da história possui uma narrativa tão impactante que pode ser comparada aos momentos em que o autor descreve em detalhes majestosos o universo e os planetas que o rondam.
Já as partes seguintes se passam no futuro – o começo do século 21 –, narrando expedições astronáuticas com abordagens diferentes. Sendo que a primeira possui um foco mais objetivo, um objeto misterioso cravado na superfície da Lua e o Homem a fim de descobrir o que é aquilo. E a segunda expedição, possuindo uma complexidade fascinante, não têm um porquê definido desde seu princípio, mas quando a lemos pouco nos importamos com isto, pois nos deparamos com uma jornada perigosa e contemplativa à bordo da nave Discovery, que comandada pelo David Bowman e seu amigo, Frank Poole, além de uma máquina de inteligência artificial chamada HAL 9000, dotada de uma perfeição à prova de falhas, segundo seu criador, rumo a Saturno. É em tal expedição em que se concentram quatro das seis partes em que o romance é dividido, onde a cada capítulo que se passa a bordo da Discovery, mais fascinante e perigosa fica a jornada.
Há algo que mencionei brevemente aqui, mas sinto que devo dizer com mais cuidado e carinho sobre. A narrativa meticulosa e poética de Arthur C. Clarke ao retratar visualmente as coisas, a vida dos Homens-Primatas e as descrições astronáuticas. Assim como a narrativa dos homens-primatas é belíssima e meticulosa, mostrando a evolução do pensamento primata de forma sutil e verossímil. Aliás, há um momento na jornada para o conhecimento d’Aquele-Que-Vigia-a-Lua em que se pode escutar com tamanha maestria a canção Also Sprach Zarathustra (Sinfonia de abertura do filme do Kubrick). Momento em que o Homem-Primata pega uma pedra e descobre que pode usá-lo como arma para alcançar a evolução, e todos os outros o seguem. Algo que pode ser usado como analogia para qualquer época da história da humanidade.
“Todos os outros homens-macacos do grupo tinham parado para observar, e agora se aglomeravam ao redor d’Aquele-que-Vigia-a-Lua e sua vítima, intrigados e admirados. Logo um deles pegou a arma suja de sangue e começou a bater no porco morto. Outros se juntaram a ele e com todos os paus e pedras que conseguiram reunir, até seu alvo se tornar uma massa desintegrada”.
Talvez ler tal trecho de modo tão solto não surte o efeito grandioso de tal cena, aquela sensação que faz os pêlos do braço se arrepiar, mas parafraseei aqui o trecho para mostrar, basicamente, que a obra é repleta de momentos grandiosos. Momentos em que você lê aquilo, sobe seus olhos e pensa sobre aquilo que acabou de ler. Seja por uma reviravolta por parte dos homens-macaco ou pela descrição feita dos planetas, além de outras descrições que não poderia colocar aqui, pelo alto teor de informações importantes da trama. Principalmente pelos momentos finais da obra – mais especificamente, a última parte, que traz para nós uma sequência de acontecimentos tão magníficos, que fica até um pouco complicado de imaginar tais cenas, até chegar ao seu final, que transcende toda e qualquer definição de superficialidade e nos faz entender todo o teor metafórico e existencial que compõe toda a obra, fazendo do monólito negro ainda mais espetacular.
Por fim, devo constatar que a partir do momento em que li e reli as últimas de 2001, ele tornou-se meu segundo livro favorito de todos – ao lado do Silmarillion. Após terminar de lê-lo sentado naquele ônibus, chocado e altamente reflexivo pelo havia lido, fiquei mais um bom tempo do dia pensando naqueles acontecimentos tão grandiosos. Foi quando percebi que as seis partes separadas são fragmentos de um todo, um todo que é muito mais do que a vida dos primatas ou aventuras espaciais, é uma odisséia pela essência do Homem e da evolução que nos cerca, sempre nos levando à frente, sempre nos levando à própria extinção.
Ps.: Devo denotar também sobre a edição vendida pela editora Aleph, que é lindíssima, com sua borda e capa inteiramente preta, assim como o misterioso monólito – quem viu o filme entenderá. Junto com o romance também há dois contos do Arthur C. Clarke no final do livro, que não li ainda, mas disseram que são excelentes.
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