Livro: Na garganta do abismo existe um Jazz
Na garganta do abismo existe um Jazz, é o segundo livro de Bárbara Rosa, o livro tem uma linguagem fluída e transita entre poesia, prosa, contos e crônicas, sem perder a lucidez nem a proposta, pois tudo fica bem assentado em cada capítulo, que são como outros livros dentro do mesmo livro. E assim, viajamos na potência das palavras e todo som, imagem e reflexão que nos induz, através de histórias cotidianas que perpassa as limitações do visível da ação, existe sempre um outro lado, uma outra forma de perceber, sentir e observar. Outra característica, é a liberdade de se apropriar da palavra, ao ponto de ressignificar, criar e modernizar a forma de dizer, usando metáforas e imprimindo um olhar minucioso para com a realidade.
Página 96 – Conto 23 Andreia
Todo dia batom, protetor solar, pó compacto, blush e rímel, o ritual de beleza de Andreia.
Acreditou ser assim o bonito E era assim que a sociedade foi treinada para enxergar… uma mulher que cumpria com os requisitos impostos de seu tempo.
Ela sentia uma raiva que dificilmente sabia de onde vinha, mas geralmente aparecia junto com uma melancolia indizível, toda vez que um homem qualquer tentava segundas intenções ou se sentia no direito de dizer o que quer como se a mulher tivesse a servil obrigação de agradecer às grosserias, camufladas naqueles supostos elogios.
Começou a diminuir a largura do sorriso, por medo, por proteção por tristeza…
Era sempre nessa superficialidade que as relações se davam para ela, e Andreia então se fez metade peixe, nadando nas profundezas do sal.
No meio de uma crise, raspou a cabeça e pulou no meio do mar. Pulou tão fundo tão fundo, tão fundo que foi perdendo o ar.
De longe, ouvia vozes que a chamavam
O eco no peito…
Não via nada,
via a água cada vez mais densa e o sol cada vez mais distante.
Viu um polvo se mover lentamente.
Cada sonho um tentáculo
Cada tentáculo um membro
Cada membro dissipando
O choro abafado que ela já não decifrava, pois se confundia com as águas daquele mar.
Quanto mais fundo, menos movimento.
A mente quase limpa
e ela
Já nem sabia mais quem era.
Sabia que se fosse voltar teria que encontrar forças
No NÂO,
No SOU,
na solidez que se constrói em cima dos cacos e da areia molhada.
Sobre a autora:
Bárbara Rosa é locutora, formada em Rádio e TV, e pós-graduada em Cinema e Linguagem Audiovisual. Cursou canto no Conservatório Estadual em Pouso Alegre (MG), historiografia da arte no IFSP. Também teve vivência nas artes cênicas e visuais, produzindo vídeos e participando de exposições coletivas e solo. E nessa amálgama, Bárbara capta, processa e sutura fagulhas de vertentes artísticas, onde assim pode desenvolver seu estilo, que parte da liberdade de experimentar e imprimir seu olhar naquilo que frutifica.
Em 2018 lançou seu primeiro livro intitulado Em solidão o solo é fértil.
Contato:
e-mail: barbiezombiegirl@gmail.com
Instagram: @barbararosa_barb
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