O Canalha

Por Milton T. Mendonça

Desceu a trilha com a bicicleta em disparada. As pequenas curvas iam e viam rapidamente, perigosamente, mas Otaviano se mantinha ereto no celim. Não queria cair, não agora quase no final da prova.

Nero estava um corpo à frente, não seria difícil desbancá-lo. Chegou à planície e começou a pedalar desesperadamente enquanto alguém caia lá atrás, fazendo um barulho alto e rascante. Ele olhou para trás mas não pode ver quem era, a curva que acabara de sair não estava longe e isso lhe tapava a visão.

Nero corria veloz, sem se preocupar com quem o perseguia e Otaviano contava com isso para ultrapassá-lo no momento certo.

Ao longe podia ver o amontoado de pessoas que esperavam o primeiro colocado, e ele precisava ganhar dessa vez, nas últimas duas corridas não chegara muito bem e o campeonato estava quase no fim. Se não ganhasse essa, não teria mais chance.

Pedalou até quase perder os sentidos e relaxou. A bicicleta, veloz no asfalto bem acabado, deslizou próximo ao seu maior concorrente. Soltou as mãos do guidão e rapidamente pegou o elástico e a pedra que achara por acaso na casa de Belinha. Aceitara-a, quando a encontrou, como resposta ao pedido de socorro que fizera ao senhor Jesus Cristo, conforme ensinara sua igreja. Colocou o elástico entre seus dois dedos: polegar e indicador, e esticou até o máximo de suas forças, soltando com um estalo seco.

A pedra, de um arredondamento aerodinâmico e peso perfeitos, foi arremessada, atingindo a roda num ângulo que fizera o ciclista, pronto para começar a subir o aclive que o levaria ao podium, perder o equilíbrio. Otaviano, que diminuira a velocidade e estava a uma distância segura o viu cair batendo no chão.

Um sorriso de triunfo surgiu em seus lábios ao vê-lo ser arrastado pela inércia e se chocar com o meio fio. Ultrapassou-o e acelerou, alcançando o início da subida, último obstáculo antes do final.

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