Compasso

Arte: AnnHimchak

Compasso

por Alexandre Lúcio Fernandes

Há verdades que não pedem para gritar. Mas ecoam, silenciando os corredores subalternos e entregues aos sentimentos. Sentimentos de compaixão, de apego, que reverberam e põem ao chão as nossas fraquezas. A superfície é desenhada a passos cautelosos, curtos, mas firmes, sob uma textura que ludibria limites e sabota as tensões. Os gestos revigoram o zelo, a mansidão que se instala pelo peito, sabedor de auroras, leitor de estrelas e acenos fugazes.

A pele se reconstrói em abraços de cura, como templos que reerguem os pilares da fé. Cegas são as dores que acorrentam, pois sobrevivem para romper, libertar a centelha de um amor que adormece oculto sob as franjas da carapuça humana. As cortinas celestes guardam um olhar minucioso, uma constelação de confissões que se desmancham por entre cadeias estrelares. O universo responde, feito pó que se reintegra e se apresenta feroz, porém minúsculo, dentro do nosso seio. A poesia se distende, iluminando mansamente a penumbra de salas abandonadas.

Ouvir o pulsar torna-se um mantra que pacifica, chave para bonitas rotas de esperança, caminhos que se iluminam, reluzindo horizontes que nascem convidando sorrisos. Os passos dão voltas em torno de desejos soterrados, apelos trancafiados pela penumbra de dias densos e desconfiados. O coração é reduto de auroras que geram vida e arrebatam nosso corpo quase fincado pelas raízes da descrença. Amores são luzes no meio da nossa escuridão, dessa onda de incertezas que se move por toda a nossa alma, sedenta por um colo.

Tênue é a crença que impulsiona nossa determinação, pois se eleva parelho à abismos de indolência, a gestos que amenizam a dureza de persistir. São os sobreviventes que permanecem aos tropeços, enxergando a paisagem através da neblina. Mesmo que as trilhas se acidentem, a caminhada edifica e nos leva a desobstruir dificuldades e obstáculos. O alvorecer faz-se presente a quem se lança frente aos desafios desta vida tão imprevisível. O mundo responde a quem se entrega no imaginário, a quem se aventura sem saber o que vai encontrar logo adiante.

Ver a vida amanhecer exige olhos abertos, sobretudo corações desavisados, fartos em esperança, e em sonhos quase não destrincháveis, quase incompreensíveis. Enxergar pede um querer alinhado, mas também pede mansidão, atenção às curvas que se desenham coloridas e enigmáticas ao redor. Os roteiros, fabricados à mão nua, impelem a alma a prosseguir, fiel e silente, no compasso do coração.

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será publicado.


*