Comer, morar e sobreviver!
Por Raul Tartarotti
Vivi minha primeira vez em muitas descobertas, durante essa existência por vezes cansada de novas buscas.
A primeira viagem, a visita ao Museu, o primeiro castelo na areia, a roupa nova no verão. A primeira comunhão, e a festa de minha formatura na faculdade, foi inesquecível.
Porém, muitos rostos que talvez tenham cruzado em nossa calçada, nem sequer sabem o que tudo isso significa, ou como poderia ser realizado. Porque ainda vivem em condições análogas à escravidão.
Não consigo acreditar que escrevo essa frase em 2023, após Cristo nascer. São pessoas que não tiveram oportunidade em participar em nada similar a uma das sete gerações de uma família feliz e efervescente como foram os Buendía, descritos no livro “Cem anos de solidão”, por Gabriel Garcia Marques.
Os escravizados levaram vidas lamentadas pelo isolamento, descaso e algo muito mais doído além do desumano. Alguns encontrados nessa condição são quase idosos, e com frequência acabam em abrigos públicos, onde iniciam sua vida social na busca de laços para uma reconstrução emocional.
Quando são jovens e de centros urbanos, recebem cursos profissionalizantes na tentativa de encaminhar uma carreira.
O rosto do trabalho escravo contemporâneo no Brasil, ainda é masculino e predominantemente da zona rural Brasileira. Existe uma coordenação Nacional de erradicação do trabalho escravo e enfrentamento ao tráfico de pessoas (Conaete); pertence ao Ministério Público do Trabalho.
Somente em 2022, foram encontrados pela fiscalização, 2600 trabalhadores no Brasil, em condições degradantes de trabalho ou em jornadas exaustivas. Imaginei que somente os babuínos-sagrados, que vivem no Zoológico de Melbourne na Austrália, fossem as únicas criaturas capazes de cometer crueldades uns com os outros. Os pedidos de ajuda vem inesperadamente de ambos os lados, e um fio de esperança se mostra como sendo a única saída onde essas pessoas se agarram, cheias de fé de que uma boa alma possa colaborar com seu novo destino.
Ter uma profissão, uma nova família, amigos, um sonho que muitos que se soltaram das garras de um caminho cruel, puderam usufruir como cidadãos de bem. A abolição ainda não encerrou, ela aconteceu apenas legalmente, é muito recente, e o Brasil ainda não reparou os 380 anos de escravidão; há muitos resquícios, e as necessidades em comer, morar e sobreviver levam o indivíduo a se submeter. Uma lástima que não resolvemos isso antes, e também não erradicamos a fome.
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