Vou-me embora pra Pasárgada – Manuel Bandeira
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d’água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcaloide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.
Libertinagem (1930)
Este poema de Bandeira nos faz refletir. Fico feliz por errar, infeliz por não amar, sinto-me um ator sempre a representar. Quantas máscaras, mas eu amo. Não me dispo de meus personagens. Quem realmente somos? Talvez por isso escrevemos compulsivamente – Para nos decifrar.
Quase meia noite, virarei abóbora novamente?
Ouço incansavelmente tantas músicas.
E ainda não fiz uma que faça sentido para você?
Joka Faria
8 de Novembro de 2023
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