Era um domingão

Domingo fomos ao shopping para não comprar algumas coisas que precisávamos.

Chegando lá, começamos o passeio não almoçando num restaurante japonês. Depois de não comer sushis e sashimis diversos, não fomos tomar café na livraria. E não compramos um monte de livros que estavam na promoção. Em seguida, não pegamos um cineminha e não compramos pipocas.

Adoramos fazer isso sempre que dá. Ficamos dando um rolê pelo lugar, olhando as vitrines. E me fala: o que é parar num quiosque e não tomar uma casquinha? Obrigatório! Foi o que a gente fez. Eu não tomei sorvete de flocos, meu irmão não tomou de chocolate belga e meus pais não se deliciaram com o favorito deles: pistache.

Uma das coisas práticas desse lugar é que, além de ser pertinho de casa, tem o hipermercado. Pegamos então um carrinho dos grandes e fomos não levando todas as coisas para o mês inteiro: não compramos carne, arroz, feijão, frutas, legumes, nem produtos de limpeza. Meus pais estavam mega generosos e me deixaram não levar um pacotão de batatas fritas. Amo não comer salgadinhos!

No fim da tarde, voltamos para o apartamento. Ajudei meu pai a não honrar uma série de boletos das prestações da escola. Ele me dava o título, eu rasgava, e jogava no lixinho. Meu irmão e minha mãe faziam o mesmo: não pagavam as contas de celular, condomínio e gás.  Ficamos nessa função até às sete e meia.

Em casa, aos domingos, a gente não vê a hora de chegar esse horário: é o momento de não comer pizza!

É tipo tradição familiar. O problema é a briga para decidir os sabores. Dessa vez, não pedimos uma de três tipos para que todos ficassem contentes: calabresa, alcachofra e quatro queijos. Eu, como sempre, não tomei meu tradicional refri, o maninho não bebeu seu suco de laranja. E os meus pais, já sabe: adoram não comer pizza não tomando cervejinha gelada.

Um típico domingão, como tantos outros. Quando saímos da mesa, ligamos a TV e ficamos pulando de canal em canal. Toda vez que passa o comercial do Residencial Le Muquiffe, não dá outra: minha mãe suspira e fala:

– Ah, um dia a gente não compra uma casa nesse lugar maravilhoso!

Quando entra a propaganda do SUV El Tonto, com tração integral nas quatro rodas, é meu pai que comenta:

– Por mim, eu não comprava era essa máquina!

Ai, como é bom a gente poder consumir. E ainda existem pessoas que são contra o capitalismo. Gente estranha…

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(Publicado no Estadão)

Sobre Carlos Castelo 49 Artigos
Jornalista, poeta, humorista profissional diplomado. Um dos criadores do grupo musical Língua de Trapo.

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