Batman no jardim das veredas que se bifurcam.
Um labirinto de símbolos – corrigiu. – Um invisível labirinto de tempo. Coube a mim, bárbaro inglês, revelar esse mistério diáfano. Depois de mais de cem anos, os pormenores são irrecuperáveis, mas não é difícil conjecturar o que aconteceu. Ts’ui Pen teria dito certa vez: “Retiro-me para escrever um livro”. Em outra: “Retiro-me para construir um labirinto”. Todos imaginaram duas obras; ninguém pensou que livro e labirinto eram um único objeto. (BORGES, Jorge Luis. Ficcções. “O jardim das veredas que se bifurcam”)
Acabo de ler o recente encadernado do Batman, “Corporação Batman” escrita por Grant Morrison durante a fase em que o mesmo se ocupou do cavaleiro das trevas, a revista, magistralmente desenhada por Yanick Paquete e Chris Burnham leva o leitor para uma viagem pelo universo Batman e pelo mundo dos quadrinhos da década de 50 e 70 ( a era de prata dos quadrinhos). Na história, a própria cronologia da época é utilizada magistralmente por Grant Morrison para compor o enredo.
Antes mesmo de ler este quadrinho, eu já me sentia atraído a lê-lo, na ocasião do lançamento mundial do mesmo, lembro-me de uma notícia acerca do refluxo xenofóbico que a publicação recebeu na França, ao mostrar um pretendente a participar da franquia francesa do Batman (para mais informações acesse http://omelete.uol.com.br/quadrinhos/batman-hq-causa-polemica-por-trazer-heroi-muculmano-frances/). Ao mostrar que o Batman francês seria um imigrante africano, muçulmano, morador da periferia francesa. O quadrinho recebeu, por parte dos leitores franceses, uma serie de críticas xenofóbicas sobre a origem desse Batman francês, muitos afirmaram ser impossível aquele ser a imagem de um Batman francês. Sendo que o próprio Grant Morisson veio a público afirmar que sua escolha era a que melhor se encaixava na sua visão do que seria um Batman francês, considerando se a conjuntura histórica da França naquele momento, sendo aquela manifestação, racista, inútil e vergonhosa.
Porém agora, ao ler a revista, além da relação (já discutida nessa coluna) sobre quadrinhos e fatos históricos, com esse quadrinho um novo horizonte de discussões pode ser aberto, a da relação entre quadrinho e literatura. A composição narrativa dessa obra é impressionante, a inclusão de fatos históricos, bom humor, referências as histórias Sci Fi, espionagem e super-heróis da década de prata dos quadrinhos em conjunto de um roteiro digno de Borges é sensacional.
Para quem não conhece o escritor argentino Jorge Luís Borges, vale a pena conhecer, de antemão, posso afirmar que Borges é talvez o principal nome mundial do realismo-fantástico, ao lado de Garcia Marquez. Suas obras tratam desde realidades paralelas, a mitologia judaica, as filosofias orientais, temas históricos, contos que buscam se tornam real, como no caso do conto “tlon, uqbar, orbis tertius” de uma de suas obras mais reconhecidas, o livro de contos Ficções de 1944.
Mas deixando Borges de lado, voltemos para a proposta de Grant Morrison, na trama, Batman decide expandir seu combate contra o crime, seu alter ego Bruce Wayne, assume publicamente ter financiado a luta do herói Batman, e que agora daria um passo a frente, tornando o Batman uma corporação contra o crime (pretendo ainda fazer um texto sobre essa questão da privatização da paz, coisa que já preocupava o Alan Moore em sua obra “Watchmen”), em sua busca por heróis que participem de sua equipe, Batman vai ao Japão, e depois a Argentina, e é neste ponto que o roteiro se torna interessante, não vou aqui dar nenhum spoiler sobre a história, mas vale dizer que a picada de Borges com a uma conspiração internacional que deseja causar guerras entres alguns países é surpreendente.
Morrison, com seu roteiro não linear, que sabe explorar todo o folclore criado em torno do Batman nesses mais de 70 anos de história do personagem, assim como suas influências pessoais, teve como produto um das melhores histórias recentes do Batman.
Rodolfo Salvador
02042012
Comentário:
Estou aprendendo muito sobre quadrinhos, nessa sua coluna. Parabens!
Sou muito fã de Gabriel Garcia Marques e seu realismo fantástico e de Borges…Vou aguardar o que vem por aí…
Abração!!!
Elizabeth
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