A S C R I S E S C O M O S I N T O M A S
Crise é uma das palavras mais relacionadas às três grandes questões com que a humanidade se defronta atualmente: ambientais, econômicas e sociais. Esses problemas, entretanto, são sintomáticos de uma crise ainda mais profunda do que imaginamos. Ela diz respeito aos valores que norteiam o comportamento humano.
O Homo Sapiens, desde épocas imemoriais, aprendeu a agir e modificar seu ambiente de acordo com suas necessidades. Era uma espécie capaz de entender progressivamente o mundo em que encontrava e nele atuar de forma criativa. Tão relevante é essa capacidade, que alguns antropólogos deram um novo nome a essa espécie: Homo Sapiens Sapiens, o “ser humano sábio”, ou seja, o “homem que sabe que sabe”.
Essa consciência sustentava a convicção de que poderíamos criar um mundo melhor para todos, com fartura de alimentos, conforto e erradicação gradativa das doenças. Um mundo em que seria possível desfrutar de uma vida longa e plena de realizações, uma sociedade ideal.
Houve, porém, um momento nessa caminhada, em que passamos a nos equivocar. Foi quando começamos a entender a matéria, a ciência e a tecnologia como um fim em si mesmas e não um meio para alcançar a felicidade. O ser humano colocou-se pretensiosamente como o centro do Universo e se atribuiu a prerrogativa de utilizar todos os bens naturais ao seu bel prazer sem ponderar sobre as consequências.
Esse equívoco tem sido fatal e pode colocar nossa civilização à beira de um abismo. A exploração dos recursos naturais do planeta tornou-se voraz. Ao mesmo tempo, o avanço tecnológico tornou a vida extremamente artificial e os ideais humanos superficiais.
Hoje, descobrimos que somos uma ameaça para milhões de espécies, incluindo a nossa. A crise que estivemos a fermentar durante muito tempo, finalmente emergiu e em dimensões assustadoras. Os problemas que mencionamos no início – ambientais, econômicos e sociais – se correlacionam e se interconectam, o que os agrava mais ainda. Não por acaso a palavra crise está na ordem do dia.
Como sugerem riscos e perdas em potencial, as crises são temidas e indesejadas. Mas serão elas tão malévolas assim ? Não há como entendê-las e interpretá-las sob outra perspectiva ?
Façamos uma reflexão.
Se existe algo preocupante em nossas vidas é a febre. Ninguém, em sã consciência a deseja. Entretanto, ela soa como um alarme, sinalizando que há alguma infecção no corpo, pondo em risco a saúde. O objetivo maior não deve ser eliminar a febre, mas sim o que a causou.
Não serão as crises sintomas de que há algo provocando uma desarmonia no conjunto da sociedade humana? Algo como uma indicação de que velhos e consagrados modelos de vivência já não atendem mais as necessidades de evolução do homem e do planeta? Ou de que estruturas aparentemente consolidadas já esgotaram todas as suas possibilidades de ensejar qualquer tipo de desenvolvimento?
É preciso entender o significado de crise. Para os chineses a palavra crise – wei-chi – pode ter um duplo sentido. Ela é uma combinação de dois caracteres: wei (ameaça) e chi (oportunidade). A oportunidade nem sempre é percebida, mas está ali, às vezes bem no olho do furacão. Ela representa o impulso e o momento de mudar o rumo das coisas, a chance de renovação e de mover-se para uma nova direção.
Assim entendidas, as crises são desafios, caminhos para reconhecer o que deixou de servir ao processo evolutivo, o que não funciona mais por sua obsolescência e que deve ser substituído por algo novo. São oportunidades de aprender, ousar, inovar e progredir. A escolha é nossa.
Por Gilberto Silos
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