Cineclube: De modo geral, tanto o termo como a atividade, já são bastante conhecidos do público, mas para quem se define cineclubista, tem sempre aquele algo a mais, que parece faltar. Se perguntar ao google, várias definições, pontos de vista aparecem, qualificando significativamente a atividade.
Os cineclubes são organizados como Movimento, em quase todos os rincões do planeta, oportuno pois oferecer uma série de informações, talvez desconhecidas da maioria do público que identificam a importância de suas ações.
Os cineclubes nasceram na França, no início do século XX e a primeira experiência em terras brasileiras, data de 1917, ocorrida na cidade do Rio de Janeiro, com o Cineclube Paredão. Segundo Pery Ribas em depoimento a Rudá de Andrade, para Cronologia da Cultura Cinematográfica no Brasil, 1962, edição da Cinemateca Brasileira. Os nomes mais conhecidos são os de Adhemar Gonzaga, Álvaro Rocha, Paulo Wanderley, Luís Aranha, Hercolino Cascardo e Pedro Lima. Essa turma reunia na casa de Hercolino Cascardo¹, um colecionador de filmes. Eles também assistiam filmes nos cines Pátria e Iris e iam debate-los numa localidade conhecida na época como paredão. Eles, os cineclubes já nasceram com o expressivo DNA de movimento cultural, cuja vontade o conduziria esta linguagem ao status artístico.
O seu surgimento estava diretamente ligada com a questão da apreciação artística e do aprendizado, a partir da curiosa novidade, que era vista numa enorme tela branca: fotografias tiradas sequencialmente, que se movimentavam, dando a ilusão de movimento, de realidade e, para muito além da diversão, a ideia de aprender a fazer e a contar histórias por meio dessas fotografias.
O que chamamos hoje de cineclube, ainda é motivo de reflexão, alguns pesquisadores apontam o ano de 1909 como marco da primeira experiência, registrada em Paris, num período em que os “filmes faziam enorme sucesso simplesmente porque […] o cinema era direcionado às classes baixas, a analfabetos e pessoas de baixíssimo poder aquisitivo. Para isso, tudo tinha que ser muito simples, direto, claro e objetivo. Não havia espaço para sutilezas, da mesma forma que grosserias, doses de erotismo e aberrações eram bem-vindas”, aponta o crítico Celso Sabadin em seu livro “Vocês Ainda Não Viram Nada, A Barulhenta História do Cinema Mudo”, 2009, livro recheado de informações embasadas em pesquisa séria, fácil de ler, bem humorado e que vai direto ao ponto.
Dando um salto no tempo, hoje os cineclubes estão organizados na Federação Internacional de Cineclubes – FICC -, órgão que reúne as entidades de representação nacional, em mais de 70 países.
No Brasil os cineclubes estão assim organizados: Conselho Nacional de Cineclubes Brasileiros – CNC -, órgão máximo de decisão destes. Nos Estados, existem as entidades estaduais (Federações, Organizações, Associações, etc.). Os cineclubes de cada Estado se filiam a estas entidades e nos Estados onde não existem estas representações, eles se filiam diretamente ao Conselho Nacional.
No Brasil os cineclubes são reconhecidos pelo Parágrafo Único do Artigo 5º da Lei nº 6.536 de 21 de novembro de 1968, https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1960-1969/lei-5536-21-novembro-1968-357799-publicacaooriginal-1-pl.html², e pela Instrução Normativa nº 63 de 02 de outubro de 2007 da Agência Nacional de Cinema – ANCINE -, https://antigo.ancine.gov.br/pt-br/legislacao/instrucoes-normativas-consolidadas/instru-o-normativa-n-63-de-2-de-outubro-de-2007.
Com o advento da pandemia do COVID-19, muitos cineclubes entraram em recessão, outros se reinventaram, novos surgiram, muitos tiveram suas atividades invadidas por milicias de extrema direita, mas sua aventura histórica abaixo da linha do Equador, sempre foi marcada, por ações civilizatória, tendo o filme como sua principal ferramenta de trabalho.
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No próximo artigo, outro aspecto das atividades dos cineclubes no país será abordado.
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¹ – Hercolino Cascardo, sediava em sua casa atividades de exibição e debate dos filmes após as sessões. Segundo André Gatti (Enciclopédia do Cinema Brasileiro, 2000, editora SENAC), Cascardo era colecionador de filmes. Ele nasceu a 2 de janeiro de 1900 no então Distrito Federal, filho de Isidoro Cascardo, comerciante de origem italiana, adepto das ideias socialistas. Em 22, já como 2º Tenente, servia no Couraçado São Paulo que bombardeou o forte de Copacabana, revolta que culminou com a marcha do grupo conhecido como os 18 do Forte. Em 1924, participa da sublevação da guarnição do mesmo couraçado, isso porque os oficiais se recusaram a combater o governo federal. Cascardo, o oficial de mais alta patente a bordo, assumiu o comando da embarcação, ordenou a prisão dos que não aderiram ao levante. Em seguida, ruma para o sul com intenção de juntar-se às forças, militares e “provisórias”, que insurgiram no Rio Grande do Sul, movimento que desaguou na Coluna Prestes. Em 1935 Cascardo está à frente da Aliança Renovadora Nacional, agora como Almirante.
² – Está Lei, dá outras providências, continua em vigor, mas está fora de uso.
No rodapé 2, onde está escrito Aliança Renovadora Nacional, leia-se: Aliança Libertadora Nacional.