Por Vinicius Siqueira de Lima
Colunas Tortas
“Deixa eu dançar
pro meu corpo ficar Odara”
Caetano Veloso, Odara, 1977.
A configuração do corpo em Foucault passa por diversas etapas desde seus trabalhos arqueológicos, passando pelos trabalhos genealógicos (e o corpo passa a ser assujeitado pelas disciplinas), terminando na ética, no retorno ao cuidado de si.
O que queremos entender é a forma de amar no corpo, como Foucault consegue colocar o corpo como espaço de sonho, de imprevisibilidade. Sendo assim, o corpo que se percebe no toque do outro, o corpo como não-lugar, como utopia, será buscado no texto A Utopia do Corpo, do autor.
A sexualidade e o corpo
Ao longo do século XIX, elabora-se a ideia de que existe algo além dos corpos, dos órgãos, das localizações somáticas e suas funções, das sensações e prazeres; algo a mais que possui suas propriedades intrínsecas e suas leias próprias, o “sexo”.
Eduardo Cavalcanti de Medeiros[1]
Em Foucault, a sexualidade está no corpo como forma de organização, de vigilância e, de certa forma, de modulação. É a partir do dispositivo de sexualidade que o corpo é preparado para sentir o que deve sentir, nos momentos e intensidades adequadas.
O que deve ser dito e não dito sobre a sexualidade também é controlado a partir deste mesmo dispositivo. A primeiro momento, o corpo é um produto que, depois de ser fabricado, ele próprio dá condição de possibilidade para um íntimo. A intimidade do eu com o corpo parece ser possível depois da inscrição do poder.
A Intimidade do não-lugar
“O amor também, como o espelho e como a morte, acalma a utopia de seu corpo, ele a silencia, a acalma, ele a encerra como que dentro de uma caixa, ele a fecha e a sela”.
Michel Foucault[2]
Não é possível ter a imagem completa do corpo, a imagem inteira: o corpo só é visto por completo em frente a um espelho, uma imagem falsa, um reflexo. Não podemos ver nem sentir o corpo todo.
É o toque, o beijo, o calor, que nos colocam em evidência a existência do corpo, dos lábios, das partes. O que um corpo se não a união de partes não necessariamente unidas. A biologia não é suficiente.
O amor, então, é a forma do corpo fechar em si mesmo, é quando o corpo passa a existir para além do dispositivo da sexualidade. O sexo da sexualidade, então, não é o mesmo que o sexo do amor. O primeiro aprisiona, molda, impulsiona; o segundo é a imprevisibilidade de si, a existência em si.
A única possibilidade de existência fora de qualquer espaço do outro, é, paradoxalmente, nas mãos do outro. O outro específico muda: o outro do amor não é o outro da disciplina, do dispositivo.
O corpo, então, está no aqui, na hora do amor, no gesto do amor. É no amor que devemos depositar nossa confiança.
Referências
[1] MEDEIROS. E. C. de. O Corpo na Obra de Michel Foucault. Departamento de Psicologia, PUC-Rio, 2010.
[2] FOUCUALT, Michel. A Utopia do Corpo. Tradução: Victória Monteiro. Colunas Tortas, 2017. Disponível em: <https://goo.gl/iKgGza>. Acesso em 24 dez. 2017.
FOUCAULT, M. História da sexualidade: a vontade de saber. 20ª. ed. São Paulo: Edições Graal, 2010.
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