Por Milton T. Mendonça
Sentado em frente ao computador olho a tela em branco, preciso escrever mais um conto. Reviro a memória em busca de algum fato inusitado, ou, uma conversa qualquer que tenha ouvido alhures, que me venha em socorro. Porque sei o quanto é difícil colocar para fora as primeiras linhas que servirão de fio condutor para levar o leitor a uma viagem que o deixará sem fôlego, talvez, ou apenas o divirta, fazendo passar o tempo, empurrando para longe o tédio que um dia calorento trás sempre consigo, como uma praga.
– Uma história de amor? – pergunto-me enfastiado.
– Já escrevi muitas histórias de amor.
Respondo para mim mesmo tentando criar um diálogo, que mesmo bizarro, poderá se transformar em um belo conto.
Um bom conto é um achado espetacular que não depende do escritor. Os dedos vão se movendo, quase de uma maneira aleatória, comandado por um demiurgo, que de uma dimensão inacessível vai nos sugerindo qual tecla devemos apertar. Depois, quando pressionamos o ponto final e lemos o que está escrito ficamos surpresos com o que escrevemos. Quando esse ente é criativo, os leitores dizem que temos talento. Mas nós sabemos que é tudo bobagem. A única coisa que fazemos, na verdade, é apertar teclas. Mas vou dizer uma coisa: é um exercício danado de gostoso.
Você, caro leitor, concorda com isso? Acha mesmo que existe um ser em outra dimensão que nos ajuda a escrever? Não me diga que concorda com uma asneira dessas? Saiba que fico quebrando minha cabeça tentando escrever uma boa história, só para lhe dar prazer, e você me vem com essa crença ridícula?
Não meu filho, escrever é danado de difícil. Precisa-se ter muita imaginação e uma vivência razoável, para poder inventar uma história que convença e seja agradável.
Sem falar no problema da língua, o português é muito difícil. Graças a Deus existem os revisores, se não…
Isso me lembra aquele sujeito que louco para impressionar a namorada fez um encantamento, atraindo um dervixe para ajudá-lo. Ele queria escrever um conto bem bonito, porque sua amada era uma leitora voraz, só falava nos livros, e ele, pobre coitado, mal conseguia ler algumas linhas e logo uma baita dor de cabeça surgia lhe tirando a pouca concentração que conseguia. E isso, através de um imenso esforço.
O dervixe surgiu em uma explosão de fumaça e, muito zangado, foi logo perguntando o motivo que lhe sugerira poder incomoda-lo, o tirando de seus afazeres urgentes e inadiáveis. O pobre rapaz, temendo uma represália, se ajoelhou pedindo perdão. O monstrinho vendo que estava numa posição de superioridade, colocou em sua boca feia aquele sorrisinho malicioso que todos sabemos ser sua marca registrada e, fingindo uma bondade que nunca, nem por reza brava, se consegue que ele tenha, perguntou novamente ao rapaz, que desconhecendo seus atributos por não ser leitor, o olhava de maneira subserviente:
– Porquê me tirou dos meus afazeres ó ser imprestável e inútil?!
O moço tirando coragem dos belos sentimentos que nutria pela linda mocinha e voraz leitora, respondeu com voz firme:
– Grande e poderoso senhor, quero escrever um conto para impressionar minha amada e preciso de sua ajuda, pois nunca consegui ler livro algum e não sei como realizar tal façanha.
O pequeno monstro, então, contente por ter oportunidade de fazer uma maldade, o transformou em uma lagartixa, dizendo em seus pequenos ouvidos:
– Viva uma vida de animal e dessa experiência escreva seu livro, porque nem mesmo eu tenho o poder de transformá-lo em escritor, se dentro de você, não existir profundidade suficiente para conter o que procura.
Dizendo isso se escafedeu como chegou, em uma nuvem de fumaça.
O pobre vivente encarcerado no corpo de lagartixa, correu pela parede, desaparecendo em uma fresta do telhado e nunca mais foi visto. Sua amada distraída pelas peripécias de algum herói imaginário, não se deu conta do desaparecimento, e a vida seguiu inexorável.
Pois é, esse foi o fim do romance. Você quer a moral da história? Não tem! Esse é apenas um conto que demonstra bem que a intervenção da magia é desnecessária quando existe interesse suficiente em escrever. Coragem também, é claro, porque seus parentes e vizinhos vão pensar que está louco, isso sim é um problema.
Aqui dou por terminado minha faina, caro leitor, ou será leitora? Espero que sua intenção ao ler essa tenha sido diminuir sua ansiedade enquanto aguarda a hora de encontrar sua amada, ou amado, quem sabe, que espera em algum lugar desta bela cidade onde mora e, tenha conseguido.
Despeço-me com votos de felicidade plena: adeus!
2017
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