Futebol e rasteiras, nas Linhas Tortas de Graciliano

 

Futebol e rasteiras, nas Linhas Tortas de Graciliano

“Pensa-se em introduzir o futebol nesta terra. É uma lembrança que, certamente, será bem recebida pelo público, que, de ordinário, adora as novidades. Vai ser por algum tempo, a mania, a maluquice, a ideia fixa, de muita gente. Com a exceção, talvez, de um, ou outro tísico, completamente impossibilitado de aplicar o mais insignificante pontapé em uma bola de borracha. Vai haver por aí uma excitação, um furor dos demônios, um entusiasmo de fogo de palha, capaz de durar bem um mês”.

“Pois quê! A cultura física é coisa que está entre nós inteiramente descurada. Somos, em geral, franzinos, mirrados, fraquinhos, e de uma pobreza de músculos lastimável”.
“Mas, por que o futebol? Não seria, porventura, melhor exercitar a mocidade em jogos nacionais, sem mescla de estrangeirismos?”
“Ora, parece-me que o futebol não se adapta a estas paragens do cangaço. “É roupa de empréstimo que não nos serve”.

Reabilitem os esportes regionais que cá estão abandonados: o porrete, o cachação, a queda de braço, a pega de bois, e melhor que tudo, a rasteira. A rasteira! Este sim é o esporte nacional por excelência. Todos nós vivemos mais ou menos a atirar rasteiras nos outros” .
“Cultivem a rasteira, amigos!”
“E se algum de vocês tiver vocação para a política, então sim, é certeza plena de vencer com o auxílio dela. É aí que ela culmina”.

Os parágrafos entre parênteses fazem parte de um crônica de Graciliano Ramos, publicada em um jornal de Alagoas em 1921. Essa crônica foi inserida no livro “Linhas Tortas”, editado postumamente, em 1962. Trata-se de um agrupamento de crônicas escritas por Graciliano de 1915 a 1952 em jornais alagoanos e cariocas.

O autor foi um dos principais nomes da segunda fase do Modernismo. Com seu estilo pessimista e irônico não poupava críticas às mazelas da sociedade da sua época.
Em suas previsões, errou em cheio no tocante ao futebol, hoje perfeitamente integrado à cultura brasileira. Todavia, em relação à prática da rasteira no meio político, acertou bem na mosca.

Por Gilberto Silos

 

Imagem:

Fonte: https://graciliano.com.br/2013/01/a-rasteira-de-graciliano-ramos-no-futebol/

Sobre Gilberto Silos 201 Artigos
Gilberto Silos, natural de São José do Rio Pardo - SP, é autodidata, poeta e escritor. Participou de algumas antologias e foi colunista de alguns jornais de São José dos Campos, cidade onde reside. Comentarista da Rádio TV Imprensa. Ativista ambiental e em defesa dos direitos da criança e do idoso. Apaixonado por música, literatura, cinema e esoterismo. Tem filhas e netos. Já plantou muitas árvores, mas está devendo o livro.

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