Labirinto

 

Labirinto

Por Milton T. Mendonça

O dia amanheceu claro. Abri a porta da rua e saí para o jardim, o céu estava magenta. A luz, ao atravessar a atmosfera, de branca que era, se transformou em negra, fazendo as flores do meu jardim ficarem negativas. Imaginei-me numa fotografia.

Olhei para os lados e o banco, que sempre me espera encostado à parede, havia se transformado: de esverdeado em avermelhado. Os pássaros estavam todos quietos encarapitados nos muros como se fosse noite. Quase não os enxergava. Pequenos movimentos mostravam que eles estavam lá. Tudo era muito antinatural.

Meu braço azul-acinzentado fazia um contraste exagerado com a camisa que de branca fosca que fora, se transformara em branca-azulada fosforescente. Estava assustado!

Pensei que alguém tinha me prendido dentro de um filme e eu conseguira escapar antes de ser revelado. Entrei correndo e fechei a porta. A penumbra estava positiva. Acendi a luz. Tudo estava normal. Relaxei. Olhei às horas, estava confuso, não entendia direito o que estava acontecendo.

9:30h! “Cedo” – pensei. Voltei à porta e a abri de supetão. Lá fora continuava negativo. Dei uma volta pelo quintal, tudo estava negativo. Fui ao portão da rua e não consegui abri-lo. Minha chave não virava na fechadura. Aliás, virava em falso. Somente virava. Não conseguia abrir o portão.

Voltei e olhei por sobre o muro. Os objetos em derredor estavam mais distantes que o habitual. Conforme minha vista se afastava conseguia vislumbrar uma leve curvatura da luz que antes era impossível perceber. Não a esta distância.

Estava apavorado. Mas ao mesmo tempo, achei interessante. “Virei personagem de uma fotografia?” – pensei comigo mesmo. Como podia ser o personagem de uma fotografia se ontem mesmo eu era normal? Não fazia muito sentido para mim. Sentei-me no banco avermelhado e comecei imaginar as possibilidades.

Primeiro tentei estabelecer um padrão: Estou dormindo ou acordado? Levantei-me e chacoalhei os braços. Pulei para ver se voava, conforme os gnósticos insistem em ensinar. Nada! Acordado eu estava. Fui até o muro mais próximo e tentei olhar por cima. Subi nele e gritei. O som, conforme saiu, se chocou com uma parede invisível logo à minha frente e voltou se perdendo atras de mim.

Olhei para o outro lado e tudo me pareceu fantasmagórico. Circundei, sobre o muro, o perímetro do meu terreno. Os pássaros me olhavam, mas não se mexiam. Subi na casa e olhei para o lado do outro vizinho. Fui até o portão da rua. – sempre sobre o muro. Tudo estava igual. Somente para cima não deu para ir.

Deitei-me no chão. Até onde podia compreender as imagens, nada vi que curvasse a luz. Percebi porém, de onde vinha o ultravioleta. Ela emergia das nuvens. Saia de um ponto central acima delas. Eu estava dentro de um cilindro. Não era de vidro, isso já tinha percebido. Era algum tipo de luz concentrada. Um laser. Voltei rapidamente para dentro e fechei a porta. “Que é isso?!” – Perguntei alto, apavorado.
Fiquei gelado. Meu cérebro virou um pastel. Deitei-me na cama e pensei dormir. “Pelo menos o que quer que aconteça, estarei dormindo e pronto” – resmunguei cansado.

A memória de um homem sendo atacado por um leão na savana africana me veio à mente. O comentário do locutor era sobre um anestésico que o cérebro manda ao corpo no momento do inevitável.

Saltei da cama e comecei a pular. “Vou brigar” – gritei – “quero morrer sabendo quem ou o que me matou.” Peguei o telefone mas ele estava mudo. Liguei a TV. Nada estava sendo transmitido. “Caramba!” – exclamei com raiva. Fui ao quintal e peguei algumas pedras que ia usar para terminar o canteiro, nos fundos. Joguei a primeira e senti a vibração. Reflexos multicores se formaram ao movimento da luz. Subi no muro e joguei a Segunda pedra. As vibrações me mostraram o limite da minha prisão.

Voltei a casa e peguei todos os espelhos que tinha. Pulei o obstáculo caindo na casa do vizinho, que por ter o terreno mais baixo que o meu, criava um desnível que permitia minha passagem.

Com o espelho na mão e voltado para cima, o empurrei separando o cimento, da calçada, do laser. Levantei-o e ele suspendeu facilmente abrindo uma passagem. Olhei para fora e vários cilindros estavam distribuídos um em cada casa, com corredores entre eles que dava para se locomover. Olhei o sol brilhando e me senti confortado.

“O que será isso?” – falei alto, espantado – “O responsável não nos conhece muito bem. Foi muito fácil escapar” – resmunguei comigo mesmo. Levantei mais o espelho, peguei o restante que estavam sobre o piso e sai para o outro lado. Caminhei pelos corredores e vi pessoas caídas nos quintais. Uma grande torre, como uma usina puxava energia de algum lugar no alto. Um cabo enorme desaparecia além das nuvens. Entrei rapidamente e não encontrei dificuldade. Comecei a desligar tudo que via pela frente. O que não foi possível, quebrei, esmurrei, cortei.

Curtos circuitos começaram pipocar por todos os lados. Saí dali e corri o mais que pude. O rastro de luz subiu queimando, quente. A explosão iluminou a atmosfera.
Olhei à minha volta, tudo parecia como antes. As pessoas começaram a se movimentar nas ruas como se nada tivesse acontecido.

Voltei a casa e me sentei no banco esverdeado. Passei o dia olhando o brilho da grande explosão que se extinguiu como viera, de repente.

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