Lembrando Ruy
O pai, num misto de fúria e decepção, arrasava o filho adolescente: “Maurício, você me envergonha. Mais uma vez foi reprovado na escola. Na sua idade, Ruy Barbosa já cursava a Faculdade de Direito do Recife”. O jovem, malandrinho safo, não deixou por menos, respondendo à queima bucha: “E na sua idade, ele já era ministro da Fazenda do primeiro governo republicano”.
Isso fazia parte do anedotário escolar no meu tempo de ginasiano. Época em que os bons professores tinham a fama de reprovadores pela própria natureza. Os mestres eram respeitadíssimos e as escolas públicas chamadas de “templos do saber”. Ruy Barbosa era o símbolo da ”inteligência brasileira”, um paradigma e exemplo de homem público. Em geral, o melhor aluno, o “nerd” daquela época, era chamado de o “Ruy Barbosa” da classe.
Reminiscências. Coisas do passado. História. Agora os tempos são outros.
Mas, o nome de Ruy Barbosa se eternizou. E, cabe lembrar que 2023 assinala o centenário de sua morte, ocorrida em 10 de março de 1923.
Em 1870, Ruy, nascido na Bahia, bacharelou-se em Direito pela Faculdade de Direito de São Paulo, com apenas 21 anos. Foi advogado, jornalista, jurista, orador, político e diplomata. Como escritor foi membro da Academia Brasileira de Letras. Não é pouco. Mas, sua grandeza não se media apenas pelos títulos conquistados, mas pela sua vida brilhante de homem público. Joaquim Nabuco o definiu como “a mais poderosa máquina cerebral de nosso país”. Tudo isso num período de grande efervescência política e social.
Abolicionista e republicano convicto, foi político atuante no Brasil monárquico e na nascente República.
Para Ruy Barbosa, a política era “a arte de gerir o Estado, segundo princípios definidos, regras morais, leis escritas ou tradições respeitáveis”.
Defendia intransigentemente o Estado Democrático de Direito e as as liberdades individuais. Entendia que “o governo do povo para o povo tem a base da sua legitimidade na cultura da inteligência nacional pelo desenvolvimento do ensino”.
Por ironia do destino ou mera “coincidência”, o busto de Ruy Barbosa, entronizado no saguão do prédio onde funciona o Supremo Tribunal Federal em Brasília, foi vandalizado no fatídico domingo de 8 de janeiro. Naquele dia, trevas desceram sobre a capital federal, justificando aquele famoso desabafo de Ruy: “De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus…”
Valha-nos o espírito de Ruy Barbosa, neste momento em que no Brasil vivemos um deserto de homens e de ideias.
Por Gilberto Silos
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