1. Linguagem:
Sabemos que a linguagem é constituída de códigos e signos, bem como sua competência é inata ao Homem, no entanto, linguagem não é apenas a utilização de códigos, mas a operacionalização da capacidade de associar e produzir signos. Deste modo podemos compreender que linguagem e pensamento são quase a mesma coisa.
Nossa ação frente ao universo – e aqui entende-se “universo” como o todo alheio ao eu (o meio e/ou contexto) – é sempre uma representação que o codifica dalguma forma (o contexto é voz). Representar, segundo Charles Peirce, fundador da Semiótica, é “estar em lugar de”, é, pois, a ação de substituir uma coisa por outra. Por mais que nos sintamos tentados a representação da totalidade do que quer que seja, essa ação jamais será total, posto que ao interpretante cabe suas inferências. Inferir refere-se a capacidade do Homem de associar, extrair uma idéia de outra e produzir significados, e dá-se por dois princípios: Contiguidade, que é aproximação de idéias pela familiaridade ou experiência; e Similaridade, pela analogia ou semelhança da materialidade sígnica, ambos estão diretamente relacionados ao conhecimento de mundo do interpretante.
Dessa forma o que conhecemos por realidade não é realidade, mas a parcela que transformamos em signos por meio da inferência. Inferimos nos processos de significação; ou seja: inferimos pra transformar as coisas em signos. O signo é, sobre tudo, aquilo que detém um significado. Se dão os processos de inferência por meio de decodificação, o código é, pois um sistema de regras, uma sintaxe que estabelece uma ordem no encadeamento da linguagem.
2. Língua:
A língua é um instrumento de comunicação, um sistema específico de signos, comum aos membros de uma determinada comunidade, de modo que são os usuários da língua que detém o poder sobre ela, ou seja: a língua pertence aos seus usuários. Ferdinand de Saussure, estruturalista da linguagem, definiu língua como o “produto social da faculdade da linguagem”, também “um conjunto de conversões necessárias, adotadas pelo corpo social, para permitir o exercício da linguagem”. Por “corpo social” compreende-se a comunidade que compartilha da mesma língua, sendo este um dos traços que diferencia os grupos sociais. Portanto é através da língua que se traduz a cultura de um povo (comunidade, nação) e que se define sua identidade.
Há ainda os regionalismos, ou: sotaques, que se evidenciam nas diversas maneiras de pronuncia dos indivíduos que habitam diferentes regiões, são, pois, o conjunto de hábitos articulatórios dos quais resultam diversas entonações, o que confere uma identificação própria à fala de indivíduos que compartilham determinada língua. Já o dialeto é uma forma de língua que tem seu próprio sistema léxico, sintático e fonético e é usado num ambiente mais restrito que a própria língua. Em países sem uma língua oficial, por exemplo, os dialetos são formas locais de comunicação a partir das quais se constitui uma língua de união.
Mas quando nos referimos a língua não estamos tratando apenas da fala, porém também de sua representação por meio da escrita. E esta não é a única dicotomia que envolve a língua, Saussure fundamenta seu estudo na profícua oposição langue/ parole, sendo langue aquela com um aspecto social, genérico da língua, do que ele chama de prévio contrato social de uso da língua, e parole: o que se refere ao uso individual da língua.
3. Nossa Língua
A concepção da homogeneidade da Língua Portuguesa é o efeito da colonização, é o que historiciza a língua, e tem interesses político-econômicos bem definidos ao prestigiar o falar europeu. No entanto a língua praticada em outro regime enunciativo (fora da Europa) produz discursos distintos, de mesmo modo significa diferentemente, pois se estamos em lugares diferentes, só poderia haver um deslocamento que, naturalmente, força contornos enunciativos diferentes.
Ao considerar a heterogeneidade linguística compreendemos que há a presença de outras línguas dentro de uma. Assim que a língua Brasileira significa em uma filiação de memória heterogênea distinta da de Portugal, o que se refere à diversidade ocorrida no Brasil na convivência de povos de línguas diversas (línguas indígenas, de estrangeiros). E ainda nestes outros contornos enunciativos há uma variável, que já não se refere à língua de Portugal.
Clarifica a linguista Eni P. Orlandi, sobre a língua brasileira: “Há uma composição de sentidos em nossa memória lingüística que funcionam, simultaneamente, em movimentos simbólicos distintos, quando falamos a língua brasileira. Isto significa que há uma marca de distinção na materialidade histórica desses sistemas simbólicos que carrega a língua brasileira dessa composição de sentidos. Eis a duplicidade, a heterogeneidade, a polissemia no próprio exercício da língua: o português e o brasileiro não têm o mesmo sentido. São línguas materialmente diferentes”.
Sabemos que ainda hoje o padrão da língua que falamos deriva-se de textos literários europeus de séculos passados, o que gera uma série de problemáticas, e quem não corresponde a este padrão é considerado um mal falante, acabando por ser marginalizado. Reconhecer a língua brasileira como língua oficial do Brasil, além de promover sua independência e autonomia, reconhece nossa identidade na língua que falamos.
George Furlan
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