O Brasileiro que ganhou um Oscar
Por Gilberto Silos
Augusto Ricciardi era um cidadão brasileiro como outro qualquer. Família humilde. Neto de imigrantes italianos. Desde cedo começou a trabalhar e estudar. Casado, duas filhas. Com muito esforço formou-se em economia e foi aprovado num concurso para o Banco do Brasil.
Acontece, porém, que o Augustinho – como todos o chamavam – era gago. Na escola, desde criança, já sofria bullying por parte dos colegas. Isso lhe afetava a autoestima e lhe causava até um certo sentimento de inferioridade que ele carregou pela vida toda. Sua timidez era decorrente desse sentimento. Era homem de pouca conversa. Detestava entrevistas. Quando, na rua , era abordado por algum canal de televisão para dar algum depoimento ou responder a alguma pesquisa, fugia do entrevistador como o diabo foge da cruz. Tinha ojeriza a programas de entrevistas na televisão e uma aversão mortal ao Domingão do Faustão. No Banco do Brasil exercia uma função estritamente burocrática, que não lhe exigia contato com o público.
Apesar de tartamudo, o Augustinho tinha uma paixão pelo idioma inglês. Dedicou-se a aprender essa língua desde os primeiros anos do ginásio. Chegou, inclusive, a ganhar uma bolsa de estudos do próprio Banco , com direito a seis meses de estudo em Nova Iorque, com tudo pago. E o mais interessante era que Augustinho não gaguejava quando falava no idioma de Shakespeare.
A vida de Augustinho transcorreu nesse ramerrão durante muitos anos, até ele se aposentar. Em seguida ficou viúvo e a depressão começou a ameaçá-lo.
Resolveu, então, passar uma temporada com uma filha casada que residia em Nova Iorque. Por sugestão do genro resolveu fazer um desses cursos rápidos de arte dramática, aproveitando o fato de que além de dominar bem o inglês esse esforço poderia ajudá-lo a libertar-se um pouco daquela terrível timidez. Destacou-se no curso , mostrando até um certo talento para a comunicação não-verbal. Suas expressões corporais, fisionômicas e gestuais diziam muito mais que suas palavras.
Antes mesmo de concluir o curso foi contratado por uma empresa de publicidade para atuar em alguns comerciais de 30 segundos para a TV. Foi um sucesso. E para surpresa de todos recebeu um convite para um papel de coadjuvante num filme para o cinema. Ora bolas, mas um homem com tamanha timidez atuar num filme ? Não era a praia do Augustinho. Acontece que o papel que lhe foi oferecido era de um mudo, que se comunicava apenas com gestos e expressões fisionômicas. Não se exigia que dissesse sequer uma única palavra. Sendo assim ele topou.
Era uma surpresa atrás da outra. O filme foi lançado e estourou nas bilheterias. E, pasmem, o Augustinho foi indicado para concorrer ao Oscar de ator coadjuvante. Ele não acreditava no que estava acontecendo.
Na noite de entrega do grande prêmio da Academia, o Augustinho suava frio, enfiado num smoking apertadíssimo. E o mundo parecia desabar sobre sua cabeça quando anunciaram o vencedor de melhor ator coadjuvante: era ele. Subiu ao palco todo desconcertado, recebeu a estatueta com um quase inaudível thank you e rumou para casa. Recebido pela filha, toda orgulhosa, ela logo o colocou a par do que estava acontecendo: dezenas de e-mails e telefonemas convidando-o para entrevistas; e a Rede Globo já anunciava que já no próximo domingo ele seria entrevistado no Domingão do Faustão.
Ao ouvir tudo isso, Augustinho, descontrolado, tomado por um acesso de fúria, arremessou a estatueta na parede e espatifou-a em mil pedaços. Sob o olhar estupefato da família, retirou-se para dormir.
No dia seguinte, como não despertasse, entraram no quarto para verificar o que estava acontecendo. Encontraram-no morto, vitimado por um infarto. Dar entrevista no Domingão do Faustão ? Nunca. Morrer seria mais digno.
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