O Porto Luminoso – Poemas de Abiel Abarbanel Macabeu

O Porto Luminoso

Poemas de Abiel Abarbanel Macabeu

g.a. lima

 

 

 

 

Porto luminoso

Ali onde dorme

Um sorriso luminoso

Cheio de tristeza

E ondas de sonhos.

 

Naufrágio

Navios de guerra

& Versos de amor agitados

Como bandeiras de países

Arrasados de economia frágeis

Dos sonhos o mar levou a

Leveza a pedra o duro olhar

Amores antigos e navios

Encontrados.

 

Para isso

Rostos para o trabalho

como qualquer

onda criada

por que será que nos queixamos tanto?

 

O infinito

Dentro daquela porta

Está o infinito infinito

Entremos a ele

 

Para o nada inexprimível

 

Bruna

Não há segredo no mar

Entre as ondas e os teus olhos

O verde puro das folhas do

Amor e do amor o segredo

Dos nossos sonhos

 

Do caos

De uma simples

compra,

um caracol ladrejado

uma imensa cátedral

para san tiago

no meio do deserto

a água o pó a moeda

alguém grita de dentro

mesmo

que as portas

tenham muitas estrelas

. fazei uma lista de mar .

se comprarmos o oceano

poderemos beber suco

de laranja

mesmo que a manteiga

seja mais cara que o garfo

e nós queixemos dos juros

soberbos dos bancos.

 

Lembro

Dos montes serenos

Tenho uma lembrança imensa

 

Mas eu ainda era pequeno

E o céu já era cheio de estrelas

 

Adormeci

 

Acordei e não lembrei quem era

 

Achei que o destino poderia

Responder tais questões

 

E fui brincar com o outono

Nos olhos da primavera

 

 

Trabalho

O céu azul

é

imenso por cima

 

o sol queima os

caramujos e as flores

carregando

 

palha a

lenta lembrança

da voz de um rio

 

um tucano

me lembra as terras

dos meus ancestrais turcos

 

servi eu a solimão

o magnífico

nas suas guerras

contra os húngaros?

 

Dor

Não entendo o coração

Nem o que compõe

Seus segredos na noite

Como pode o dia nesse

Simples pulsar

Carregar tanta dor?

Dizei irmãos meus onde

A fraternidade se esconde

Nesse mundo insólito?

Nessa insônia onde ando

Vago morto no meio

Desses mortos que se

Dizem vivos (e estão mais

Mortos que os próprios mortos).

Dizei irmãos meus por que

Sentir tanta dor opressão

Nesse simples objeto

Nesse simples coração?

 

 

Êxodo visto por outro ângulo

Existiram reis

E ainda existem

No xadrez e na terra

Uns por decreto de Deus

 

Disseram assim

Governavam mais

Aos que se levantavam

Não tinham pena em

Matar

 

Mesmo assim a lei de

Moisés teceu o caminho

 

Chega da escravidão

Nesse egito esquisito

 

Levantou o povo com trombetas

E acompanhados de noites

Um bezerro de ouro enfureceu

Os olhos do Eterno.

 

Ao chegar a Canaã

Um estranho ritmo de sons

Lembrou a canção de Abraão

Nosso pai na fé

Quando com menos do que nada

Carregando a voz de Deus na alma

Cantava:

 

Caminhando eu vou

Para Canaã

 

De noite eu canto como quem canta

É noite

Já posso cantar

Como antigamente

Sem som e sem ritmo

Em silêncio e com as folhas

Isso porque chegou o outono

E logo vem o frio

É noite e não há estrelas

Nem posso sonhar com

Prédios porque aqui não

Há nenhum e mesmo assim

Eu não lamento isso

Apenas respiro o ar

E velo a noite com belo

Olhar de quem quer cantar

Poesias ou uma enigmática

Canção

 

Posso mesmo dizer

Que a noite não passará

Assim como minhas palavras

 

Passarão?

 

Prestai atenção

Prestai atenção

Nas minhas estrofes

Beduínas

Que o sino seja o mar

Que relintina a vida pós vida

 

Se

Se tu também

Meu amor oh rosas brancas

Jogadas fora

 

A mãe

Ao pé do fogão

Os olhos embaçados

As lägriminhas de estrelas

Pingam pelo telhado da casa.

 

O pai

Do coração a saudade

Do perfume ao luto

Do sol ao olhos dos olhos

Aos minutos.

 

O avô

A meiguice do campo

Na voz

 

A avó

A meiguice do mar

Em teus

Olhos

 

Se a noite

Se a noite

 

os nossos

sonhos buscam

lírios

 

e o ar da vida

se nós deixamos

a melancolia ou o caracol

 

o lírio

o destino

 

 Saudade

Eu disse como o rabino

Quem plantou colher quis.

 

O livro do destino

Quando pequeno tive interesse nas feições dos tigres. Achei encantadora as imensas lágrimas dos crocodilos e fingi que os querubins rodeados no jardim fossem misturas de tigre com crocodilos. Ao mirar o retrato da donzela no espelho, seus olhos eram como dois punhais abrasados pela fúria do amor. Mesmo assim eu ainda me lembrava da feição aterrorizante do tigre prestes a atacar a carabina e o luar.

Depois de algumas semanas fiz questão de esquecer a figura manchada do laranja e do negro que exalava dos tigres. Tais cores eram para mim o retrato de uma inominada cegueira. Então como se a hipnose e a religião estivessem se guerreando em minhas ternas alucinações, contemplei a figura dourada de um leão e o marfim dos elefantes, como se a brisa e a morte quisesse decifrar uma estrela.

Na escola desenhei tigres, crocodilos e leões. Os espelhos acharam incorreto descrever a juba de um só felino, e tive que me contentar a dizer que os sonhos me estavam conduzindo a criação de um zoológico fantástico.

Por fim antes de cruzar os corredores da biblioteca, abri uma enciclopédia e vi a figura de um leão. Ali estava o tigre e o crocodilo. Eu não consegui entender os sinais misteriosos de tais acontecimentos. Por fim tratei de esconder o livro numa estante que não seria jamais vasculhada. O segredo do tigre está guardado comigo. O leão continua a assombrar meus sonhos. E o crocodilo seria o punidor dos pecados. Será escrito tais coisas no livro do destino.

Livro do Destino, escrito por Zairi Ben Ryaldin

 

Manhã

De manhã os sonhos

se espalham pelos olhos

 

Povo

Há no povo

Uma consequência

Coletiva da qual

Nem o Nilo nem o Eufrates

Tem culpa de tais

Consequências.

 

Espelho

Eu não me vejo

Nesse espelho

Os reflexos são

Embaçados e

Por isso os olhos

De narciso já não

Estão refletidos

No rio sem rumo

Do infinito

 

Essencial

Esse mundo

Não é o meu

Mesmo assim

Aqui estamos

Tu e eu

Sombra e Luz

Sol e Lua árvores e flores

Pedras e vulcões

 

Assim quando olhamos

Os pontos distintos

Iremos sorrir como dois

Beduínos e seremos próximos

 

Assim que a noite seja serena

E a eternidade irrigue nossas odes

 

 

Bárbaros

Aos bárbaros um brinde

Não entendo suas conversas

 

Vejamos

Nesse verde

e nesse

azul igual

a uma caracolinha

iríamos acabar encontrando

o mar o deserto o infinito

o paraíso.

 

Dilema

Olhem o campo e algumas flores e se a noite deslizar de manhã que a maçã e a morte e o sol

sejam luz poesia algo qualquer coisa

 

Quando se tem alegria

Aí saudade de algo

que não sei nomear

 

Fiz

Vejamos o tempo

essa coisa curiosa

 

um livro um sol

uma flor um pêssego

 

pensemos com

a tradição rabínica

porque sabemos já

que quem planta

colher espera

 

por que será que

um dia o mar quer ser rio

se o rio teima em ser mar

primavera ?

 

Quem pensa

Não há vazios

Apenas conversas

Que não levam a

Lugar nenhum

 

(Não é isso a vida, filósofos, ?

 

Vida

Então

foi assim

a eternidade

a serenidade

camuflados

de conchas

com o

intrínseco sinal

do fim?

 

 

Gabriel de Ataide Lima (nome aportuguesado de Gabriel Benslimane Klein Ben Macabee, ✡ 1996, Adamantina) é escritor, cartunista, comediante e animador brasileiro de origem judaico-libanesa.

É autor do livro Quase Barroco Novo, editado por conta própria, e vários outros trabalhos publicados na Revista Subversa e no Jornal OPovo do Ceará.

É letrista de músicas gravadas por Cida Ajala como Luz da Lua em Adamantina (https://youtu.be/C6baXm56Fic) e Me Deixas Louco (https://youtu.be/_LXIDeEMgow).

Sua série de cartuns WARNER SEM LIMUSINE é publicado no Jornal Impacto de Adamantina semanalmente.

Além disso tem a série de cartuns DUVIDADOS, publicados em seu blog pessoal – gabrielk-poetamarginal.blogspot.com/?m=1

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