O Que a Pandemia Pode Ensinar
Há muita gente estudando a pandemia do coronavírus. De um modo geral as abordagens atêm-se ao aspecto científico e suas consequências econômicas, sociais e psicológicas. Há pouquíssimos estudos, por exemplo, no âmbito da espiritualidade. A esse respeito há muitas interrogações. O que o covid-19 tem a ver com o comportamento, sentimentos e pensamentos das pessoas? Qual a relação causal entre esse vírus e a maneira com que elas encaram a vida e o mundo? O que essa pandemia quer ensinar? No que ela pode mudar o comportamento humano?
Tudo isso me faz lembrar a obra “A Doença Como Caminho”, de autoria de Rudiger Dalke e Thorwald Dethlefsen, médico e psicólogo, alemães. Depois de anos de estudo em conjunto, eles identificaram uma relação entre os estados mental, emocional e espiritual de seus pacientes com os sintomas que eles apresentavam. Chegaram a interessantes conclusões.
Chamou-me particularmente a atenção o tópico dedicado às doenças respiratórias.
O processo respiratório compõe-se de duas fases, opostas e complementares: inspiração e expiração. Formam uma polaridade, em que um polo depende do outro para subsistir. Há um intercâmbio: pela inspiração o oxigênio contido no ar é transportado aos glóbulos vermelhos e com a expiração o anídrido carbônico é eliminado.
O ar é um elemento comum a todos os seres vivos na natureza. Não é propriedade de ninguém. Por meio dele estamos conectados uns com os outros. É o cordão umbilical que nos une ao macrocosmo. A respiração impede o ser humano de se isolar, apartando-se dos outros. Todos vivemos nesse mesmo alento. Lemos no Gênesis que Deus infundiu seu alento divino na figura de barro, transformando-a em criatura vivente. Nas línguas antigas a palavra representativa de alento também servia para designar “alma ou espírito”.
“A resistência em estabelecer contato direto com todo mundo por meio da respiração se manifesta, por exemplo, no espasmo respiratório da asma. O asmático inala em demasiado e quando tem de exalar chega ao espasmo. A polaridade tomar e receber deve manter-se equilibrada.” A acumulação impede a fluidez, quebra o ritmo natural. Quem não sabe dar, tem dificuldade em receber na quantidade certa.
Parece uma metáfora da atual condição humana, numa época em que o egoísmo e o egocentrismo pautam as relações interpessoais. Há uma dificuldade imensa em olhar para o outro, atentar para suas necessidades, angústias e aspirações. Olhar para o próprio umbigo é prioridade.
A moderna tecnologia criou meios de comunicação eletrônica sofisticados, tornando desnecessário o contato presencial. Podemos permanecer online o tempo que quisermos sem sermos incomodados. Assim, ninguém vai nos importunar com suas queixas, conversas chatas e pedidos de ajuda. Permanecemos fechados não em nossa casa, mas em nós mesmos, com o simbólico “ar que respiramos”. Em algum momento podemos nos sufocar com o ar que recusamos a compartilhar com os outros. Agora, a pandemia nos obriga a permanecer em casa contra a nossa vontade e a usar máscaras protetoras quando saímos. Sofremos porque ansiamos conversar com as pessoas, abraçá-las livremente, sem restrições e não podemos.
Afinal, o que a pandemia quer nos dizer?
Por Gilberto Silos
2021
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