Os excêntricos causos de São José dos Campos
por Paola Domingues
Se você leitor, é um morador de raízes interioranas, da cidade de São José dos Campos, por acaso já deve ter se deparado com algumas “lendas vivas”, ou pelo menos ouvido falar de um tal “minotauro corpo-seco pé de bode” que frequentava as noites de forró nas casas de “show” da cidade. Ou ainda, conheça alguém que trabalhe ou trabalhou na Embraer; talvez tenha feito algumas compras no Shopping Colinas ou pelo menos, tenha passado pela Av. Nelson D’ávila. São José é realmente uma cidade incrível! Espelho de metrópole, cultura miscigenada do interior.
É nesse ciclo social que encontramos dois jovens músicos que, em 2013, ainda de forma muito despretensiosa, compilaram algumas ideias do que viria a ser a Banda do Folclore Joseense Desbocado, reunindo um amontoado de fatos bizarros e verídicos das mais diversas épocas e que já fazem parte do conjunto histórico-cultural de São José dos Campos.
Bruno Ishisaki, Mestre em processos criativos formado em 2014 e atualmente doutorando em música pela Unicamp. Marco Ântonio Machado (Boi), Doutor em música pela Unicamp em 2016, Docente e Coordenador Pedagógico na FavColesp. Esses foram os primeiros integrantes a idealizar o que seria então a proposta dos Joseense. Inspirados na postura de Arrigo Barnabé, em poesias diversas e músicos compositores de diferentes épocas da história – inclusive atuais, a Banda Carlos (piada interna dos integrantes) contextualiza episódios pessoais, figuras sociais e do meio cultural joseense, aborda temas contemporâneos, lendas urbanas e lendas vivas do município com um toque de sarcasmo e bom-humor.
Em 2014, a Banda do Folclore Joseense Desbocado deu início efetivamente, incluindo o baixista Gustavo Neves e o baterista na época, Fred. Gustavo está no último ano do curso de bacharelado em música na FavColesp e é professor de música pela Fundação Cultural de Paraibuna.
Todos os membros partem de uma ideologia que bem define Belchior: “Sons, palavras, são navalhas e eu não posso cantar como convém sem querer ferir ninguém”, não esquecendo que o projeto concede espaço à liberdade de expressão de cada integrante, nas composições e arranjos musicais. As ideias vêm geralmente dos “cabeças” da banda: Bruno e Boi, que normalmente entregam a música pronta para os demais executar: Gustavo e Rodrigo Kusayama. Rodrigo entrou para a banda recentemente, é bacharel em música pela FASC, Baterista profissional, professor de música e produtor. Já conhecia o trabalho da BFJD desde a formação e acompanhava de perto o processo musical muitas vezes participando de algumas apresentações.
Todos os integrantes podem expor suas opiniões para o enriquecimento das composições, a única regra do grupo é que se o compositor não quiser tocar mais sua música, ela sai automaticamente do repertório.
Falando sobre as músicas, uma das composições que foi criada por três dos integrantes é a “Expressiva né”, que inicia com voz e composição do baixista Gustavo Neves e expõe a figura joseense como um cidadão incapaz de expressar-se devidamente e observar suas limitações. A música conta com as colaborações de Bruno Ishisaki e Boi. Arranjos com solo de clarinete e flauta são percebidos durante a canção, o que também é uma característica da banda em incluir diversos instrumentos musicais. Esse conceito de concatenar ideias também é o que move outra de suas canções, a “Saci Fundamental”, que tive a oportunidade de conhecer na última de suas apresentações em São José dos Campos e que, inclusive já conta com a contribuição do baterista Kusayama. Nesta música, a linguagem é a protagonista do tema, críticas aos platonistas e opiniões diversas são incorporadas ao texto em andamentos razoavelmente complexos.
A “Cidade de São José” composta por Bruno, foi uma das primeiras composições criadas logo no início da banda. O tema aborda uma crítica ao comportamento dos cidadãos joseenses e seu obcecado desejo pela estabilidade financeira e status. A composição ainda explora pontos de referência da cidade como o Shopping Colinas e a mundialmente conhecida, Embraer, o que facilmente chama atenção daqueles que habitam a região.
Eu como ouvinte e espectadora, observo a banda como um grupo de artistas que estão prontos para expor seus pensamentos e compartilhar suas recordações, permeados pela cultura interiorana e o sentimento de Polo Industrial da cidade de São José. Ao mesmo tempo, confesso que as melodias exercem a função de surpreender o tempo todo entre progressões e cadências que “fogem” do habitual “quatroporquatro” de todo dia.
Como artistas, os quatro integrantes cumprem seu papel de expor seus conhecimentos, cumprem a certo modo com o dever social e atribuem divertimento a seus ouvintes.
Acredito que a busca pela compreensão da mensagem, vem desse sentimento de dúvida e o despertar da curiosidade que a música produz. No entanto, não alcancei de fato essas conclusões logo de primeira. A proposta da banda nos insere num ambiente que é preciso pensar. A cada vez que eu tentava refletir sobre todos esses elementos, novos ângulos eu observava, outras dúvidas surgiam e basicamente, esses fatos me levaram a pensar que não era somente um grupo de músicos que querem “fazer um som”, mas uma mensagem que está permeada nessas palavras e que podemos interpretar de várias maneiras.
Apesar do atual cenário musical estar praticamente paralisado devido à crise no país, a banda acredita que estamos vivendo uma época de grandes descobertas musicalmente falando. Com a tecnologia e internet a disposição, pulverizar a proposta e sua mensagem tornou-se um objetivo razoavelmente fácil, o que aproxima mais admiradores que compartilham da mesma ideia e acompanham seu trabalho. Depois de um ano bastante movimentado com um segundo trabalho que todos fazem parte, o Coletivo Tempo-Câmara, os integrantes da Banda do Folclore Joseense Desbocado, se programam para, em breve iniciar novas composições e continuar o andamento desse trabalho que exibe muita criatividade e respeito à música.
Para conhecer mais sobre a banda, acesse:
SoundCloud: https://soundcloud.com/osjoseense
Essa matéria foi publicada na Edição de Inverno da Revista Entrementes:
Leia a revista completa:
2018
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