Ovo frito para o meu amor
Por Reinaldo de Sá
Ele me bate, sim. É só quando ele tá nervoso. Não é todo dia, não. Ontem, por exemplo, ele não me bateu. Hoje sim. Amanhã?…
Desde que a gente casou, quer dizer, se amigou, eu apanho. Minha mãe disse que a mulher tem que obedecer o marido em tudo. “E se ele bate é porque quer o melhor pra mulher. Fique calada! Não perca o seu hôme!” É assim que a minha mãe fala. Eu acho que é o mesmo que aconteceu com ela. Vivia machucada, mancha roxa no corpo. Eu nunca vi nada. Ou vi?…
Ele gosta muito de ovo frito. Come quase todo dia. Gosta da gema mole, bem amarela. Come com gosto, molhando o pão na gema e, depois, corta a clara com o garfo. Corta em pedaços bem pequenos e vai comendo junto com a comida. É bonito ver, sabe? Outro dia, ele não gostou da gema e esfregou o ovo na minha cara. O anel dele arranhou meu olho e eu fiquei uma semana sem enxergar direito. Quem mandou eu não fazer a gema mole do jeito que ele gosta? Bem feito pra mim, pra largar de ser besta, trolha, vagabunda, vaca, porca, burra, cadela, galinha. Tudo nome que ele me chama…
Hoje eu fiz o ovo certinho. A gema bem mole, a clara bem redonda, sem queimar as beiradas. Coloquei meia pitada de sal na gema e meia pitada de pimenta do reino na clara. Igual a mãe dele fazia. Tudo certinho. Coloquei também um nadica de veneno que a minha amiga Lana disse que não aparece na… não sei dizer o nome… tóps? tópsia?
(Autor: Reinaldo Rodrigues de Sá)
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