Data de leitura: 01-07-2024 a 04-07-2024
Ficha de leitura
Título: PHOMBE Um trágico 9 de Janeiro em Chitima
Autor: Juvenal Bucuane
Editora: Editorial Fundza ©
Coleção/ Edição: –
Ano de publicação: 2023
Género literário: Novela
Número de páginas: 115
Resumo: Juvenal Bucuane é um autor consagrado de Moçambique, cuja obra tenho vindo a acompanhar com bastante interesse. Tem mais de vinte obras editadas até ao momento.
PHOMBE é uma bebida tradicional feita à base da fermentação do milho, que imagino semelhante à kissangua de Angola (em maior ou menor grau de fermentação). Tive o privilégio de ter uma conversa com o autor antes de ler o livro, que incidiu, desde logo, sobre a maneira como se pronuncia corretamente phombe. Entretanto o autor foi-me contando também um pouco da história, que relata um acontecimento ocorrido em 2015. A dada altura tive de lhe pedir para não avançar mais na narrativa (ou terá sido ele a tomar essa precaução?) de forma a não quebrar o sigilo nem o interesse. Um leitor voraz, como suponho que seja o seu caso também, gosta de tomar conhecimento dos factos por via da leitura, embora não desdenhe uma boa conversa e seja, naturalmente, um bom ouvinte.
A história desenrola-se em vinte e nove curtos capítulos, precedidos de uma nota introdutória (que explica as envolventes do acontecimento) e de um poema que evoca e tragédia. Baseia-se num caso real ocorrido em Chitima (distrito de Cahora Bassa, Tete) onde pereceram 75 pessoas, incluindo crianças, e foram assistidas no hospital e nos postos de saúde locais outras 177. Uma vez que o caso foi tornado público à época, todos os contornos da história são conhecidos e foram divulgados, mas, ao romancista, resta ainda margem para tecer o seu labor nos espaços em branco da notícia e nas margens do rigor factual.
Esta novela detalha os factos de forma realista, toda a parte da medicina legal, as pesquisas laboratoriais, a intervenção dos serviços de saúde da região, o envolvimento das autoridades, das famílias e da comunidade. Retrata os hábitos da população local e as circunstâncias que antecederam o triste evento. Foram acionados mecanismos legais para conter os danos e a natural solidariedade das pessoas (assim como a das empresas e instituições, até de outras localidades) deu-se espontaneamente, como seria de esperar.
Quanto à verdade científica, só foi conhecida passado algum tempo, uma vez que o país não dispunha, aparentemente, de laboratórios com recursos técnicos e/ou humanos suficientemente apetrechados para levarem a cabo a investigação de forma conclusiva. Por outro lado, alguns outros países a quem Moçambique fez apelo, como a África do Sul e Portugal, tampouco conseguiram dar uma resposta conclusiva que ajudasse a esclarecer a tragédia que se abateu sobre a as famílias e a comunidade.
Na falta de respostas cabais, ou enquanto estas não chegam, surgem especulações, teorias da conspiração, maledicência, hipóteses mirabolantes ou raciocínios mais ou menos coerentes. Assim são as leis do mundo, sobretudo quando se trata de um caso que chocou a população e tomou conta do quotidiano de uma forma dilacerante e prolongada no tempo. Todos querem encontrar culpados rapidamente, chegar a uma explicação racional, engendrar soluções, mitigar o sofrimento, repartir as dores, prevenir tragédias semelhantes. A tradição e a importância da educação para a saúde, a saúde pública, são alguns dos temas que se destacam e serão explorados com clareza pelo autor.
A novela sublinha ainda a entreajuda, os laços familiares e o relacionamento entre as pessoas da zona, a vida de bairro, os amores clandestinos, a inveja, o ciúme e as desconfianças, as idiossincrasias. Lembra também A Praga, do escritor angolano Óscar Ribas. Não é um livro para ser contado nem analisado exaustivamente: é uma novela que merece ser lida com atenção ao pormenor, sobretudo para quem aprecia histórias policiais ou intrigas nacionais ligadas a casos aparentemente inexplicáveis e totalmente imprevisíveis.
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