Que não nos faleça a esperança
Pelo menos no estado de espírito da grande maioria das pessoas este foi um Natal diferente dos outros. O avanço da pandemia afetou a paz e a alegria com que se comemora essa data cristã. Deu para perceber uma certa melancolia no ar. Uma preocupação generalizada com 2021 e suas nebulosas perspectivas. Diante de um cenário de incertezas, põe-se à prova a fé de quem abraça alguma crença.
Em vários aspectos foi um Natal idêntico a tantos outros. Mais uma vez as tradições religiosas sucumbiram à sanha consumista. A maior celebração da cristandade transformada em máquina de ganhar dinheiro. Mesmo com a economia capenga e o coronavírus rondando por aí, o comércio registrou um bom movimento. E, como acontece há muito tempo, o “ilustre aniversariante” permaneceu esquecido. Alguém ainda se lembra da tradicional Missa do Galo? Poucos, talvez.
As coisas mudaram muito. Os líderes religiosos cristãos mostram-se impotentes e até omissos diante dessa realidade. E deles não se vê iniciativa alguma para ao menos tentar redespertar esse sentimento de religiosidade outrora tão caro ao Natal. Usando um jargão do pugilismo, resolveram, em definitivo, “jogar a toalha”.
Restam, do Natal autêntico, seus símbolos originais. Mas, a sua compreensão não chega à base da “pirâmide”. As metáforas, as estruturas essenciais da simbologia natalina, são interpretadas do ponto de vista de seu referencial concreto. O nascimento virginal, a gruta, os animais, os Reis Magos e suas oferendas, tudo isso perdeu o seu significado mais profundo. Hoje são usados como peças do marketing natalino. A mística estrela de Belém figura em cartões postais e anúncios televisivos.
Machado de Assis finaliza assim o seu belo soneto de Natal: “Mudaria o Natal ou mudei eu?” Procede a pergunta.
Quem mudou? O que mudou?
Onde foi que nos extraviamos?
De qualquer forma, algo deveria mudar. Foi o que nos sugeriu o místico Angelus Silesius em suas palavras: “Embora o Cristo nasça mil vezes em Belém, se não nascer dentro de ti tua alma seguirá extraviada”.
Que não nos faleça a esperança em 2021! Feliz Ano Novo!
Por Gilberto Silos
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