Retratos: ISABEL ALLENDE

Lápis aguareláveis.
Série: poetas e outros escritores.
20 – 2025
CHILE/EUA
Recentemente li «Violeta» e «O vento conhece o meu nome», belíssimos romances. Isabel Allende é uma das minhas romancistas de eleição, há várias décadas.
Excerto da resenha:

“(…) O VENTO CONHECE O MEU NOME cativa desde o primeiro parágrafo. Ao longo dos vários capítulos vamos conhecendo as personagens (por vezes pela sua própria voz), as circunstâncias, sempre com períodos marcantes da História universal como pano de fundo, como os primórdios e os despojos da II Guerra Mundial, na Europa. Isabel Allende é uma escritora rigorosa que respeita a verdade histórica, malha sobre a qual vai tecendo os seus enredos sempre muito convincentes, realistas e mesmo assim surpreendentes e extraordinários.

Quase nada será verdade absoluta, mas quase tudo é possível e provável, recorrente, uma quase transcrição de múltiplas realidades. Muitas vidas e acontecimentos se escondem por trás das personagens e dos seus dramas familiares e sociais. Romancear talvez seja a arte de contar verdades com mentiras. Os franceses chamariam a isto uma “boutade” (um dito vivo, imprevisto, original, que roça o paradoxo), mas é esse tipo de sensação que o romance sugere.

Isabel Allende é uma romancista moldada pelo jornalismo e pelo ativismo social; e isso fez dela, desde há muitas décadas, uma fabulosa narradora, muito atenta ao pormenor, que não deixa nada ao acaso. Como narradora não julga nem opina de forma descabida ou moralista, mas expõe, denuncia, esclarece. As opiniões, caprichos, atitudes, excentricidades e linhas de conduta ficam por conta das suas criaturas. Neste romance temos um leque riquíssimo, o “elenco” inclui várias crianças e famílias vítimas de violências diversas, inomináveis. Do Holocausto aos crimes silenciados, branqueados e perpetrados pelos Estados ou por bandos e bandidos organizados, por eles protegidos e armados, atos coletivos ou individuais que constituem vergonhas e tragédias humanitárias e deixam um rasto de cinza e cicatrizes perpétuas. Crueldade que, infelizmente, se mantém e aperfeiçoa cinicamente ainda nesta época que nos cabe viver, um pouco por todo o mundo.

A autora homenageia, neste romance, todas essas crianças e famílias que ao longo dos tempos têm sido martirizadas também pela indiferença humana que por vezes assume forma de lei, deslocados, refugiados, pessoas que nada têm a perder e que arriscam tudo porque não têm nada, ou quase nada.  Apenas dignidade, amor, instinto maternal/paternal e de sobrevivência.(…)”

 

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Sobre Luisa Fresta 43 Artigos
Luísa Fresta, portuguesa e angolana, viveu a maior parte da sua juventude em Angola, país com o qual mantém laços familiares e culturais; reside em Portugal desde 1993. Desde 2012 assina crónicas e artigos de opinião em jornais culturais, revistas e blogues de Angola, Portugal e Brasil, essencialmente sobre livros e cinema africano francófono e lusófono. Esporadicamente publicou em sites ou portais culturais de outros países como Moçambique, Cabo Verde e Senegal. Em 2021 e 2022 traduziu O HOMEM ENCURRALADO e ESPLANADA DO TEMPO, ambos do poeta brasileiro Germano Xavier (edição bilingue português-francês/Penalux). Em 2022 ilustrou o poemário infantojuvenil DOUTRINA DOS PITÓS, do poeta angolano Lopito Feijóo (Editorial Novembro). Desde 2020 mantém um grupo virtual intitulado ESCOLA FECHADA/ MENTE ABERTA, criado no início da pandemia, destinado a divulgar literatura infantojuvenil e artes plásticas, nomeadamente ilustração, com especial incidência no universo lusófono e francófono. O principal objetivo é consolidar os hábitos de leitura das crianças, estimular a leitura em família e o gosto pelo desenho; e aproximar escritores e ilustradores de leitores e da comunidade escolar. Tem textos dispersos por antologias, alguns dos quais integraram projetos pro bono, e outros premiados em Portugal e no Brasil, desde 1998; assim como um livro de poesia vencedor do prémio literário Um Bouquet de Rosas Para Ti, em Angola, atribuído pelo Memorial António Agostinho Neto (2018). Curiosidade: o poema Casa Materna, que dá título ao livro (originalmente designado por Casa ambulante), foi distinguido com o 2º prémio de poesia internacional Conexão Literária (Câmara Municipal de Divinópolis/Brasil) quando a obra já se encontrava em processo de edição. OBRAS DA AUTORA: Contexturas (contos, baseados em quadros de Armanda Alves, coautora), Livros de Ontem, 2017; Março entre meridianos (poesia, 1º prémio “Um Bouquet de Rosas para Ti”), MAAN, 2018; Março entre meridianos (reedição), Livros de Ontem, 2019; A Fabulosa Galinha de Angola (infantojuvenil), Editorial Novembro, 2020; Sapataria e outros caminhos de pé posto (contos), Editorial Novembro, 2021; Burro, Sim Senhor! (infantojuvenil), Editorial Novembro, 2021; Casa Materna (poesia), Editorial Novembro, 2023; A Idade da Memória (infantojuvenil, contos inspirados na poesia de Agostinho Neto. Coautora: Domingas Monte; ilustrações: Júlio Pinto), Mayamba Editora, 2023; No País das Tropelias e Desventuras (Coleção Capitão/ infantojuvenil), Editorial Novembro, 2024.

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