Uma crônica sobre o tempo
Mais de quatro décadas se passaram desde que aportei em São José, fugindo daquela correria de São Paulo. Fui muito bem acolhido aqui na terra de Cassiano Ricardo. Por tudo o que esta cidade representa em minha vida, não tenho motivos para arrependimentos. Eu procurava qualidade de vida numa época em que o caos urbano já se instalava na capital paulista.
Aqui, encontrei um ambiente calmo e ordeiro, contrapondo-se a tudo aquilo que eu resolvera deixar para trás. Mas, São José cresceu muito ao longo das últimas décadas, ganhando um ritmo de pequena metrópole. E a pressa veio junto.
Sou um observador do quotidiano. Gosto de acomodar-me nos bancos das praças e ficar observando as pessoas transitarem. Às vezes me espanto ao vê-las tão apressadas e esbaforidas. Já lhes perguntei porque são apressadas a ponto de arriscar suas vidas , ao atravessar as ruas imprudentemente, com o semáforo fechado e veículos transitando em alta velocidade. A alegação mais comum é de que têm muita coisa por fazer e estão atrasadas. Há ainda quem justifique a pressa pela necessidade de economizar tempo ou então não perdê-lo.
Tudo isso parece decorrer da atitude em relação ao tempo. Grande parte da humanidade está obcecada com essa ideia, especialmente naquelas culturas que experimentaram os maiores saltos no desenvolvimento material.
Tempo é algo a ser economizado? Isto é possível? A verdade é que se procura encaixar cada vez mais atividades ou afazeres dentro do tempo disponível.
Procuramos fazer compras em supermercados para economizar tempo e ainda assim nos angustiamos nas filas do caixa querendo que andem com mais rapidez. Tudo para inserir mais algumas coisas no nosso dia.
Construímos modernas rodovias para reduzir o tempo de nossa viagem em 20 minutos. Abrimos túneis para economizar outro tanto. E assim segue a vida, e o homem, seduzido pela ideia da eficiência temporal, concentra muito de seu talento criativo em fazer mais coisas em menos tempo.
Às vezes me flagro agindo com pressa sem um motivo objetivo para isso. E, aí me pergunto: “Fui engolido também por esse ritmo trepidante? Fui subjugado por esse automatismo inconsciente?”.
Conta-se que Gandhi, estando em Londres para negociar a independência da Índia, fez uma caminhada a pé junto com a sua comitiva, do hotel onde se hospedava até o edifício do parlamento inglês. Mesmo caminhando dentro daquela famosa pontualidade britânica, alguém sugeriu que enveredassem por uma determinada rua, porque lhes faria ganhar mais tempo. E Gandhi perguntou: “E o que faremos com o tempo ganho?”.
Tudo é feito com pressa, depressa, escravos que somos de vários fatores de aceleração. Aprendemos, crescemos, movemo-nos e mudamo-nos, tudo isso mais depressa. Aonde queremos chegar ?
Por Gilberto Silos
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