A Explosão da Aventura nos Quadrinhos

A Explosão da Aventura nos Quadrinhos

Por Jorge Hata*

No dia 7 de Janeiro de 1.929 coincidentemente, houve o lançamento de dois comics nos jornais americanos, que iriam mudar radicalmente o caminho das histórias em quadrinhos:- Buck Rogers e Tarzan. Os quadrinhos eram predominantemente cômicos, daí o termo americano “comics”, com as travessuras de meninos terríveis e de famílias pequeno-burgueses da periferia. Mas em 1.929, junto com o crack da Bolsa de Valores de Wall Street, a aventura emergiu soberana no mundo dos “Comics” para inaugurar a Era Dourada das artes dos anos 30. A volta a Rousseau em Tarzan e a fuga (ou conquista) para o espaço em Buck Rogers faziam parte do quadro social. Em verdade, Buck Rogers nascera em agosto de1.928, quando Amazing Stories publicou “Armagedon 2419 A.D.” de Philip Nowlan, narrando a história de um piloto da Primeira Guerra Mundial que, vítima de uma estranha inalação de gases, perde o sentido por 500 anos. O editor John F. Dille teve a ideia de ilustrar essa história. Contratou o desenhista Richard “Dick” W. Calkins e lançou no jornal de Evansville, “Courier Press”, a versão colorida ilustrada de Buck Rogers no Século XXV. Nesta versão, Buck é um tenente da aviação americana, transportado para o século XXV, em luta na terra, no mar e no espaço contra seu rival Killer Kane, cujo sonho é raptar Wilma, noiva do herói e subjugar a Terra. Haviam cinturões antiogravitacionais, pistolas de raios, televisões, bombas atômicas – seis anos antes de Hiroshima – e montes de malvados asiáticos. Esta HQ, imensamente popular, foi publicada até 1.968 e deu início a uma moda mundial:- bonecos, camisas estampadas, baies e outras parafernálias. Lançou também algo inédito nos quadrinhos, até então, como nos seriados do cinema, no fim de cada capítulo dominical, havia um lembrete aos leitores “To Be Continued next week” (continua na próxima semana)…

O consagrado escritor de Ficção Científica, Ray Bradbury, revela que o som mais agradável de sua infância, provinha do ruído, domingo pela manhã, do jornal atirado no jardim pelo jornaleiro-ciclista, trazendo as paginas de seu ídolo, Buck Rogers. Na década de 30, um seriado com Larry “Buster” Crabbe, produzido pela Universal, encantou a garotada nas matinês de domingo. Por seu lado, Tarzan, após o surpreendente sucesso do romance, foi levado para o cinema, em 1.918, pelo diretor Scott Sidney; – “Tarzan of the Apes”, com Elmo Lincoln no papel principal. Mas somente em 1.929, o United Features Syndicate lançaria em quadrinhos a figura de “Tarzan”, na pena de Harold Foster. Observe-se que Foster nunca empregou os balões em “Tarzan”, mas uma narrativa direta incorporada aos quadrinhos. Ele desenharia “Tarzan” até 1.937, abandonando-o para se dedicar a seu próprio personagem:- O Principe Valente. Para substituí-lo foi convidado Burn Hogart, que se tornaria o mais famoso desenhista deste personagem. Dotado de profundo conhecimento de anatomia, Hogart faria de “Tarzan”, uma verdadeira aula de desenho ambientado nas florestas retorcidas e angustiantes. Em 1.933, a King Features Syndicate (a tradução para syndicates é “agência distribuidora” e não sindicatos” como erroneamento se traduz), lançou Brick Bradford. Herói, de início vivendo aventuras com vaqueiros no Oeste americano. Brick logo seria jogado no mundo da Ficção Científica pela imaginação criativa de William Ritt. Em sua cronosfera (espécie de pião dotado de um mecanismo semelhante ao da máquina de tempo de Wells), Brick é levado para confrontos com animais anti-diluvianos, insetos gigantes, homens-pássaros e robôs assustadores.

Então apareceu Flash Gordon, obra-prima e marco fundamental dos quadrinhos modernos. Criação de Alexander Gillespie Raymond, tido como o mais completo de todos os grandes criadores de Histórias em Quadrinhos. Quando em 1.933, o King Features Syndicate instituiu um concurso, criando um personagem para concorrer com o famoso Buck Rogers, de Dick Calkins, o vencedor foi um jovem e talentoso desenhista, justamente Alex Raymond, que havia ganho dois concursos semelhantes:- Agente Secreto-X-9 (para fazer frente a Dick Tracy) e Jim das Selvas (para combater Tarzan). O Agente X-9 é um homem do FBI que combate o crime, insinuando-se entre criminosos e lançando mão de seus hábitos e até de seus métodos. Jim das Sevas é um caçador de feras e explorador da África e do Oriente Médio que, sempre junto de seu empregado hindu, Kolu, e de sua companheira Lil, consegue sobrepujar inimigos, traficantes, piratas e agitadores. Flash Gordon foi lançado no dia 7 de janeiro de 1.934, no New York American Journal. A diferença básica entre Buck Rogers e Flash Gordon é que Buck dependia de uma assessoria científica para atuar em suportes verossímeis. Flash era fruto dos delírios de Alex, que suplantou em muito a realidade da sua época O que Raymond oferecia aos leitores tinha aquele “algo mais”, que já começava a faltar nas aventuras de Buck Rogers e Brick Bradford;- a imaginação. Na série Flash Gordon, três personagens principais do planeta Terra – Flash, sua noiva Dale, e o professor zarkov – chegam ao Planeta Mongo a aí se veem às voltas com o Imperador Ming.

É Grande poder de imaginação de Raymond, que apresenta paisagens maravilhosas do reino das sombras, da cidade submarina, do país dos homens azuis. Flash sempre triunfa sobre Ming, a encarnação do mal, depois de combates violentos. Em Raymond há unidade perfeita entre a imagem e a ação e o estilo incisivo e claro que lhe garantiram o sucesso obtido. Alex Raymond “inventou” a aerodinâmica – a Força Aérea americana solicitou a remessa, para seu departamento de criação, de todos os desenhos de Flash Gordon, pois os foguetes imaginados pelo artista resolviam difíceis problemas de aerodinâmica:- o designer de moda futurística – em 1.934, sua heroína Dale Arden usava as mini-saias, que Mary Quant exibiria três décadas depois: instituiu a poligamia entre os personagens de HQs e estabeleceu as bases para a arte dos quadrinhos. Desenhou o Trem Osaka – Tóquio, com todos os detalhes em 1.938, naves, submarinos, aquecedores, pistolas de laser, roupas térmicas, equipamentos cirúrgicos, bolhas submarinas, roupas e penteados como se estivesse recriando novamente o universo, à maneira de Júlio Verne. Num de seus boletins oficiais a NASA reconheceu se haver inspirado nas histórias de Flash Gordon, para resolver determinados problemas de suas cosmonaves. A relação da previsão, visual e gráfica das coisas atuais nessa série de HQ é tão extensa quanto cansativa e repetitiva, mas não é surpreendente para quem tentar procurar e relacionar e estudar as coisas que Raymond usou e ainda não foram descobertas.

*JORGE HATA
HISTORIADOR E COLUNISTA na HATA QUADRINHOS

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