Auto-estima

Por Milton T. Mendonça

Madalena se observou no espelho com uma expressão séria, o corpo nu refletido a incomodava bastante. Seus pés pequenos e frágeis, com belas unhas bem tratadas a deixavam frustrada. Subiu os olhos. Mirou a forma suave dos joelhos, arredondados idênticos, e os considerou grosseiros. As coxas como um cone invertido, grossas, com penugens finas e douradas que deixavam uma sombra encorpada em toda sua extensão a deixou infeliz. As ancas largas de mulher fértil com o triângulo escuro formando o monte de Vênus, e dividindo seu corpo em duas partes a entristeceu. As pernas longas se uniam sem folga, tocou em sua intersecção e sentiu a umidade dos pequenos lábios. Franziu o nariz num muxoxo desgostoso. A cintura, duas meias circunferência, criava espaço suficiente para uma barriga lisa, sem um grama de gordura, a fez respirar inquieta. Tocou o umbigo pequeno, nem muito fundo, nem muito raso e o dedo penetrou sem dificuldade. Sentiu-se apreensiva.

Levantou os olhos, desanimada, e se deparou com os ossos levemente delineados, antecedendo os seios. Dois montes pálidos um pouco maior que o côncavo de suas mãos, rígidos, com os mamilos grandes, levemente mais escuros que o resto do corpo, prontos para o prazer ou a amamentação. Considerou-os insípidos.

O pescoço fino sustentado por ombros delicados, tendo em seu cume uma cabeça redonda, com longos cabelos encaracolados, vivos e brilhantes, negros como o azeviche, a deixou consternada – “Porque não são lisos?” – perguntou aflita aos deuses, jogando os braços bem torneados com pequenas mãos de dedos sensíveis, e unhas vermelhas, para o alto.

O rosto de traços ovalados e bochechas salientes, separadas por um nariz perfeito, que enriquecia seu semblante e sombreava uma boca carnuda, sanguínea e sensual a deprimiu. Seu belo sorriso que convidava o interlocutor a uma viagem onírica entre dentes de marfim branquíssimos e uma língua cor de rosa e ágil não a deixou satisfeita. Balançou a cabeça desesperada, fixa na imagem, a reprovando mentalmente

Concentrou-se nos olhos, após passar a vista pela testa larga e seu coração se confrangeu ao se deparar com uma íris cor de mel, límpido como uma fonte das montanhas virgens do Himalaia, se perguntando aflita: “Porque não tenho olhos azuis?”. Sem reparar nas belas sobrancelhas e longos cílios que doava ao seu entorno uma auréola de pureza e melancolia que tanto atraía a atenção de todos ao redor.

Desnorteada, se virou percorrendo as costas reta, pousando o olhar nos glúteos redondos e salientes, permeado por penugem albina, clareada é certo, mas muito sedutora. Sentiu-se a pior das mulheres, uma bruxa em vias de ser queimada em praça pública por ofender os passantes com sua imagem horripilante.

Escancarou as portas do guarda-roupa tentando afastar de si àquela imagem terrível. Pegou a mini-saia branca, a blusa de seda natural azul celeste, a calcinha também branca e se sentou na cama, desolada.

“Não posso continuar desse jeito! Preciso melhorar minha auto-estima!” – exclamou alto consigo mesma. “Uma plástica?” – Repetiu como sempre fazia ao acordar e precisava enfrentar o espelho, quando então, se deparava com seu corpo nu e tinha que encarar a verdade sem subterfúgios.

Lágrimas correram pelo seu rosto. Abatida, se vestiu, calçou a sandália de salto alto, na tentativa desesperada de aumentar o mísero metro e sessenta e cinco que tanto a atormentavam. Tomara o desjejum frugal de costume e com a bolsa Vuiton a tiracolo saiu à rua em busca de certezas que trouxessem um pouco de paz as suas inquietações.

Caminhou devagar, atenta. Na praça Padre João virou em direção à rua Quinze de Novembro esperando que alguém a notasse. Ouviu o primeiro olá, quando, perdida em sua dor, começava a fazer planos para uma vida de reclusão e abstinência.

O rapaz sem graça que a cortejava se aproximou. Convidou-a para um café. Aceitou aliviada por se saber desejada.

Após o café, já se sentindo amigo, a convidou para um encontro mais íntimo. Ansiosa por uma opinião masculina, o acompanhou solícita ao hotel de alta rotatividade, estabelecido nas proximidades.

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