Entrevista com Francisco Gomes

 

 

ConVersa e Prosa 

(Entrementes – Revista Digital de Cultura)

Colunista: Bruno Cena Macedo

Editora: Elizabeth de Souza

 

Biografia:

Francisco Gomes é piauiense de Campo Maior, mas vive em Teresina, PI. É poeta, músico e graduando em Letras – Língua portuguesa (Bacharelado). Publicou os livros Um outro universo ou tonal (2021), O despertar selvagem do azul cavalo domesticado (2018), Face a face ao combate de dentro (2016), Aos ossos do ofício o ócio (2014) e Poemas cuaze sobre poezias (2011). É autor do álbum sonoro Diafragma — poemas em áudio (formato físico, 2018; formato digital, 2020). Dedica-se cotidiana e arduamente à poesia, num trabalho de pesquisa, leitura, contemplação e escrita.

 

Poemas

OSSOS DO PEIXE-OFÍCIO

Meu sentimento de poeta

em meu temp(l)o

é isca pra linguagem:

ao mesmo tempo que dou linha

sou peixe

fisgado

em anzol de palavras.

 

[Sem título]

Nenhuma súplica transcende

o perfume dos jasmins pairando sobre aqueles

que acreditam

no viver-não-é-o-suficiente.

viver é além do sim não às vezes

assim como as mãos são lógicas

quando mergulham no intocável do escuro

tateando

um resquício

daquilo que se foi aceso

e ainda brota

nos gestos do esquecimento

apagando

os corpos.

 

 

Entrevista

 

Comente um pouco como foi o seu despertar para a escrita. Em qual momento você passou a se intitular escritor? 

O despertar foi aos doze anos de idade, quando li o livro de poemas Saga da terra do poeta piauiense Luiz Rocha. Apesar de não ter entendido quase nada, senti. Esse livro foi o caminho que me levou a outros poetas e, consequentemente, uma inspiração para escrever poemas e ser um poeta.

Como é a escrita para você? Um hobby ou um trabalho?

Nenhum dos dois. Escrever poemas ou materializar poesia, pra mim, em mim, é uma necessidade existencial.

Como é a sua rotina de trabalho com a escrita? Você estabelece metas para si? Você tem outras ocupações profissionais além da escrita? Se sim, como concilia os dois?

Não tenho rotina de escrita. Por ser a revelação do inesperado, a poesia nasce do “de repente”, então escrevo quando ela se revela pra mim. Não tenho metas. 

Além de músico, trabalho como editor-adjunto na editora Caravana Grupo editorial e faço alguns trabalhos de revisão textual como freelancer.

Você tem alguma formação literária, estuda por conta própria ou escreve de maneira intuitiva? Como é o seu processo de busca por aprimoramento profissional?

Atualmente sou graduando de Letras – Língua portuguesa (Bacharelado), mas há muito tempo me dedico aos estudos literários, especialmente teoria literária, de forma autônoma. Minha escrita é intuitiva e instintiva, sempre guiada pela lucidez técnica. É como disse o Drummond: Entendo que a poesia é negócio de grande responsabilidade, e não considero rotular-se de poeta quem apenas verseje por dor-de-cotovelo, falta de dinheiro ou momentânea tomada de contato com as forças líricas do mundo, sem se entregar aos trabalhos cotidianos e secretos da técnica, da leitura, da contemplação e mesmo da ação. Até os poetas se armam, e um poeta desarmado é mesmo um ser à mercê de inspirações fáceis, dóceis às modas e compromissos.” Minha busca pelo aprimoramento profissional se dá através do autodidatismo, que grita em mim feito sede e fome de aprender, de conhecer. 

Ainda falando sobre o seu processo de criação, quais são os desafios diários de ser escritor? (Como você lida com a procrastinação? Com medo de não corresponder às expectativas? Às vezes bate aquela sensação de insegurança, sensação de não ser bom o bastante? Como você vence os bloqueios criativos de modo geral?)

Sinceramente, sobre a minha escrita, não vejo desafios, não procrastino, não crio expectativas, não sinto insegurança e nem bate essa sensação de “não ser bom o bastante”, até porque minha vivência poética não tem a ver com o que o outro pensa/acha. Materializo poesia por questões existenciais; é um compromisso com a poesia e a linguagem. Entendo que estou sempre num processo, em progresso. E entendo também, que nesse processo, fiz poemas bons e ruins, ou seja, um constante aprendizado. Aceito isso de forma consciente e compreendo que faz parte da escrita. Sobre bloqueio, no meu caso, não sei exatamente o que é. Sou de uma linhagem de poetas que não faz poemas por encomenda. A poesia não tem hora marcada, ela chega quando chega. Não forço a barra para fazer poemas. Quando o sopro epifânico vem (inspiração), materializo a poesia em poema, até porque a poesia vem antes e o poema vem depois. Claro que alguns poemas nascem prontos, mas outros, a maioria, exigem o trabalho com a linguagem (com a palavra), que chamo de transpiração.

Falando do texto em si, o que você mais gosta de escrever? Como funciona o seu processo de pré-publicação dos seus escritos e o que você acha importante fazer antes de soltar um texto no mundo?

Escrevo poemas, apenas poemas. Por estar sempre escrevendo um livro, não costumo publicar em redes sociais textos inéditos. Prefiro deixar os textos maturando, o tempo que for necessário. A poesia, mesmo urgente, não tem pressa. Quando percebo-sinto-tenho-certeza (dentro do que convencionei como método) que o livro está pronto, aí penso em publicar. Esse lance do que “acho importante fazer antes de soltar um texto no mundo”, pelo menos comigo, quando percebo que o texto (livro) já independe de mim, mesmo que esse “independe de mim” abarque questões subjetivas e relativas. Mas no meu caso, é isso.

Quantos livros você tem publicados? Você pode falar um pouco sobre as suas obras?

Até o momento, 5 livros. O primeiro, Poemas cuaze sobre poezias (2011), é vencedor do Concurso Literário Novos Autores, promovido pela Fundação Municipal de Cultura de Teresina. Como premiação, o livro foi publicado com tiragem de mil exemplares. É um livro essencialmente intertextual e metalinguístico. O segundo, Aos ossos do ofício o ócio (2014), é um livro imerso no cotidiano, nas insignificâncias e banalidades. O terceiro, Face a face ao combate de dentro (2016), é um livro mais experimental, onde a palavra é lavrada; poeta e poesia se entrelaçam, se lassam, corpo a corpo, para no final da batalha-ritual surgir os poemas, frutos do trabalho exaustivo do ato de criar. O quarto, O despertar selvagem do azul cavalo domesticado (2018), é resultado de andanças diárias e noturnas pelo centro de Teresina. É um livro que transita entre o surrealismo e o simbolismo. E o mais atual, o quinto, Um outro universo ou tonal (2021), é uma obra gerada no outono e que está imersa numa atmosfera simbólica, onde os poemas são guiados pelas vigílias do tempo (noite, madrugada, manhã e tarde).

 

Qual é o papel das redes sociais para o seu trabalho de escritor? Como é a sua interação com seus leitores na Internet?

As redes sociais têm um papel importante para o meu trabalho, pois é a partir delas que divulgo minha produção poética. A interação com quem me acompanha pelas redes é muito boa. Sempre recebo feedbacks. Inclusive, alguns leitores, que também são escritores, se tornaram meus amigos.

Como você vê o mercado editorial para os novos autores? Quais são os principais desafios para quem quer publicar?

Fala-se em mercado editorial, mas vejo mercados editoriais. Acredito que os novos autores têm mais possibilidades de publicar seus trabalhos, seja pelas editoras independentes ou através de plataformas de autopublicação. Para quem quer publicar, realmente não sei dizer quais os desafios. Mas se há, acredito que esses desafios fazem parte do processo pessoal e intransferível de cada um.

Quais são seus projetos futuros?

Não planejo nada. Meus projetos (ou projéteis) sempre são no presente, aqui e agora.

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Fico lisonjeado por você ter abdicado um pouco do seu precioso tempo para ler esta entrevista. Muito obrigado. Poesia sempre! Saravá!

 

2 Comentários

  1. Bruno, agradeço demais a sua gentil colaboração com o Portal Entrementes…E vamos em frente com mais entrevistas.
    Abração!

  2. Muito bom conhecer um pouco mais sobre Francisco Gomes, poeta e pessoa especial. Parabéns pela entrevista!

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