Manifesto contra o Orientalismo

 

Associação Brasileiras dos Coreanos

Manifesto contra o Orientalismo

Três fontes da comunidade coreana explicam por qual motivo expressões culturais da Ásia não podem ser generalizadas

 

A Associação Brasileira dos Coreanos, sediada em São Paulo e que representa a comunidade coreana no país, recebe com descontentamento a decisão da Associação Brasileira de Letras em incluir a palavra “dorama” no dicionário da língua portuguesa como obra audiovisual de ficção em formato de série, produzida no leste e sudeste da Ásia.

A Associação considera preconceituosa a decisão de generalizar as produções do leste-asiático. Não é certo generalizar expressões culturais. Cada produção tem suas características, peculiaridades e um público específico. Generalizar é confundir as peculiaridades. É como falar que toda comida nordestina é comida baiana.

Há um esforço muito grande por parte da Coreia do Sul em mostrar uma representatividade. Após a guerra da Coreia está em curso o resgate da cultura milenar coreana que sofreu uma tentativa de apagamento na época da colonização japonesa no início do século 20. Esse resgate se evidencia em várias formas de expressões culturais, tal como K-Pop, séries, gastronomia etc.

Para contextualizar no cenário mundial, o dicionário Oxford havia incluído a palavra K-Drama e não “dorama”. E em nenhum outro país do mundo as séries asiáticas são generalizadas. Aliás, não existem para as séries da Europa, por exemplo, o termo “Eurodramas”.

Se o mundo inteiro reconhece que não podemos generalizar expressões culturais, por qual motivo o Brasil vai fazer o contrário?

Fica aqui registrada a nossa indagação e a esperança de uma revisão por parte da Associação Brasileira de Letras à luz da compreensão sociocultural do tema em foco.

Augusto Kwon, presidente da Associação Brasileira dos Coreanos

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“’Dorama’ é uma palavra niponisada de um termo em inglês, transcrita dessa maneira por força das características fonéticas do silabário japonês, o que não é o caso da escrita coreana, a qual permite transcrevê-la como ‘drama’, i.e., igual ao vocábulo em inglês. Ou seja, quando chamamos os seriados coreanos de K-drama, estamos usando o termo em inglês já transcrito para o coreano, e não o termo original do inglês, como pode parecer. Da mesma forma, existe o termo P-drama para designar as telenovelas filipinas. Por isso, generalizar as produções do sudeste asiático como ‘doramas’ seria como chamar todos os asiáticos de ‘japa’, contrariando a tendência atual de dar voz às minorias, se é que podemos chamar os dramas coreanos de minoria no quadro atual das produções de streaming no mundo.”

Dra. Yun Jung Im, professora e coordenadora da graduação em Letras – Coreano da Universidade de São Paulo (USP)

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“O uso no Brasil do termo ‘dorama’, em japonês, generaliza e apaga indústrias midiáticas asiáticas. Esse apagamento fortalece estereótipos e reforça, assim, o orientalismo. O drama de TV é um formato televisivo realizado em diferentes indústrias da mídia no Leste e Sudeste Asiáticos. Chamar um drama sul-coreano, ou K-drama, de ‘dorama’ é mais uma forma de estereotipar um consumo, além de ativar estruturas históricas de raízes imperialistas. ‘Dorama’ é um neologismo que ainda pode ser combatido, até porque todo este debate não é um preciosismo linguístico, mas sim uma questão séria de apagamento midiático de diversas perspectivas culturais e de profunda carga imperialista de um passado extremamente recente. Vamos respeitar as culturas, especialmente quando somos tão fãs de suas produções.”

Dra. Daniela Mazur, pesquisadora do MidiÁsia, grupo de pesquisa da Universidade Federal Fluminense (UFF)

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