O Trenzinho do caipira e outros trens

O  TRENZINHO  DO  CAIPIRA DO CAIPIRA E OUTROS TRENS

Por Gilberto Silos

Em 1872 os chamados Barões do Café, fundaram, na cidade de Campinas, a Companhia Mogiana de Estradas de Ferro. O objetivo era transportar a produção cafeeira daquela região até o porto de Santos. Na época o Brasil era o maior produtor e exportador de café do mundo.
A Mogiana, que também transportava passageiros, cumpriu um papel importante no desenvolvimento econômico e social do Estado de São Paulo. A extensão da rede ferroviária paulista chegou a 8.622 quilômetros em 1940 . Desse montante, 2.000 quilômetros eram da Mogiana, que alcançavam o Triângulo Mineiro. Havia, também, um ramal até Passos – MG. Em 1971 foi incorporada pela Fepasa e hoje só transporta commodities. Infelizmente, nos anos 40 começou o desmanche do sistema ferroviário brasileiro. Na década seguinte, cedendo a pressões e interesses externos, o Brasil optou pelo transporte rodoviário. Foi o único país de dimensões continentais que desmantelou seu modal ferroviário.
Tenho uma ligação afetiva com trens. Meu avô materno era ferroviário. Trabalhou durante 42 anos na Companhia Mogiana, onde se aposentou. Quando eu era criança adorava ouvir as histórias que ele contava sobre os trens. Eu residia na cidade de Casa Branca, perto da estação ferroviária. Passei aquele período de minha vida ouvindo os apitos das locomotivas, primeiro das chamadas marias-fumaças e depois daquelas movidas a diesel. Aquilo tudo me fascinava. Eu me sentia viajando naqueles trens , conhecendo outras paisagens, pessoas, sons, odores. O transporte rodoviário ainda engatinhava. Havia poucas estradas asfaltadas. Tudo dependia do trem, que compunha a vida e a paisagem do interior do Brasil. Não faltou inspiração aos nossos artistas, prosadores e poetas, para retratar, cada um com seu talento, aquela realidade cotidiana.
O pintor Cândido Portinari foi um deles. Nascido em Brodowski, perto de Ribeirão Preto, conviveu com a cultura cafeeira naquela região, e foi autor de várias telas abordando aquela paisagem. Aquela riqueza era transportada pelos chamados Trenzinhos do Caipira, que faziam seu percurso muitas vezes atravessando extensos cafezais.
Em 1930, o maestro Heitor Villa-Lobos, ao compor a sua extraordinária Bachianas Brasileiras número 2, inseriu-lhe na quarta parte a tocata O Trenzinho do Caipira. Villa-Lobos sabia aliar o popular ao erudito. Nessa música os instrumentos da orquestra imitam os movimentos e sons de uma locomotiva. Essa música foi e ainda é tocada no mundo todo.
Anos depois de sua composição, a música O Trenzinho do Caipira recebeu uma letra escrita pelo poeta Ferreira Gullar, e foi gravada por alguns dos nossos grandes intérpretes, como Edu Lobo, Maria Bethânia e Zé Ramalho. Hoje ela é parte integrante da cultura brasileira.

2018

Sobre Gilberto Silos 187 Artigos
Gilberto Silos, natural de São José do Rio Pardo - SP, é autodidata, poeta e escritor. Participou de algumas antologias e foi colunista de alguns jornais de São José dos Campos, cidade onde reside. Comentarista da Rádio TV Imprensa. Ativista ambiental e em defesa dos direitos da criança e do idoso. Apaixonado por música, literatura, cinema e esoterismo. Tem filhas e netos. Já plantou muitas árvores, mas está devendo o livro.

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