
Excerto da resenha:
“(…) Às Mulheres Portuguesas (ou “Ás Mulheres Portuguêsas”, como então se escrevia), foi o primeiro manifesto feminista português (uma obra que, por outro lado, alia o feminismo a uma postura patriótica, de acordo com o contexto da época monárquica, a poucos anos da implantação da República. Nessa altura, Portugal estendia-se ainda por várias colónias, mais tarde denominadas províncias-ultramarinas, que são, atualmente, países independentes).
O livro e as ideias nele defendidas pela autora traduziam uma postura visionária, revolucionária e avançada para a época. Ainda hoje se justifica refletirmos sobre muitas destas reivindicações, como a questão da paridade, e várias ideias e linhas argumentativas impõem-se pela sua contemporaneidade. Rosabela Afonso, escritora e cofundadora da ACCIG – Associação Cultura, Conhecimento e Igualdade do Género, refere-se assim a Anna de Castro Osório e à obra, na NOTA INTRODUTÓRIA:
“Escolhemos reeditar este livro porque, apesar da importância de Anna de Castro Osório em diversas áreas da cultura portuguesa, permanece pouco conhecida do grande público (…)”. E, mais adiante, lembra-nos que a autora foi “(…) uma das personalidades femininas portuguesas cuja importância foi de grande relevo aquando da implantação da República em Portugal (…)”.
Também a BREVE NOTA BIOGRÁFICA, no início do livro, destaca outros importantes aspetos da biografia da escritora.
“(…) pioneira em Portugal na luta pela igualdade de direitos entre o homem e a mulher. Escritora, feminista, ativista republicana (…)”.
A pertinência da atual reedição da obra advém do facto de se comemorar, este ano, os 150 anos do nascimento de Anna de Castro Osório (1872-2022). Considerada a fundadora da literatura infantil em Portugal, Anna de Castro Osório também traduziu autores estrangeiros de literatura infantil, foi jornalista, editora e pedagoga, eminente teórica do feminismo no Portugal de então. Cidadã de causas e forte caráter, acrescentaria ainda.
(…)
Voltemos ao manifesto Ás mulheres Portuguêsas, apresentado como um conjunto de textos centrados no caráter fundamental da valorização das mulheres e da sociedade em geral através do ensino, como ferramenta de progresso social e desenvolvimento do país.
O facto de muitas das afirmações da autora ainda se manterem na ordem do dia pode significar que as lutas sociais não produzem efeitos tão rapidamente como gostaríamos, ou apenas são bem-sucedidas parcialmente. Há batalhas que duram décadas ou mais e se desenrolam a velocidades diferentes nos diversos cantos do globo. Em todo o caso, devemos reconhecer os passos gigantescos em relação à emancipação da mulher em Portugal desde o momento em que esta obra foi dada à estampa, há exatamente 117 anos. Anna de Castro Osório não escreveu certamente o livro para que as mulheres, ou os cidadãos de hoje, o usassem como medida. Talvez procurasse sobretudo despertar e questionar as mulheres portuguesas e homens do seu tempo, para que as mudanças ─ imperativas ─ fossem desencadeadas sem demora. De qualquer modo, confesso ao leitor que teria alguma curiosidade em conhecer a perceção da escritora sobre os progressos consentidos de lá para cá, quimera só possível no domínio da imaginação, que enfatiza e projeta as viagens temporais…
Nesta obra destaca-se a importância crucial da educação das mulheres, da consciencialização cívica, social e política ─ não apenas da sua capacitação intelectual pessoal, mas também aos olhos da sociedade. A autora insiste na comparação com outros países europeus, de maneira a fazer uma avaliação relativa do quadro legal português à época, relativamente à Mulher.
Depreendo também, pelas teses defendidas e evidenciadas nestes textos, que lutar pela igualdade de género não significava necessariamente uma postura constante contra todas as formas de ostracização (estamos em 1905, lembrem-se), mas antes uma afirmação perentória e inequívoca da importância da mulher no mundo, pois era claramente considerada muito abaixo do seu real potencial e valor intrínseco. Por outras palavras, o foco da obra é a discriminação das mulheres em Portugal, abordada de uma forma legitimamente acusadora, mas também muito construtiva, propondo soluções e apontando caminhos (…)”.
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