Superfície – Capítulo 9

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Por Milton T. Mendonça

Superfície – Capítulo 9

Sentei-me na cadeira de espaldar alto que tinha atrás de minha mesa de trabalho diminui a luz ambiente e acionei o controle. A tela iluminou-se e os dois casais apareceram sorrindo e conversando com bastante familiaridade, caminhando em direção à cantina.  O corredor estava vazio àquela hora, todos os trabalhadores estavam em seus afazeres. A câmera frontal mostrou o rosto dos visitantes e percebi o brilho de entusiasmo de seus olhos maliciosos enquanto os rostos inocentes das meninas sorriam alegres e confiantes. Não pude deixar de sentir um engulho. Segui seus passos até o bar onde se sentaram no sofá semicircular que contornava a mesa de centro. A atendente aparecera ao primeiro levantar de braço, solícita, com seu belo sorriso de dentes perfeitos em uma boca vermelha e sensual. Imediatamente atraiu a atenção dos homens que a olharam de um jeito vulgar. Temi que o plano se degringolasse pelo excesso de malicia daqueles marmanjos mundanos, mas imediatamente uma das garotas abriu a blusa deixando a mostra boa parte de seus seios perfeitos e praticamente sacudiu-os na cara dos sujeitos. Os olhos dos devassos quase saíram das órbitas o que fez com que nós três que assistíamos o desenrolar da comedia caíssemos na gargalhada. Parei o filme por um momento e deixei a alegria tomar o próprio rumo e morrer no seu tempo adequado. Voltei a ligar o aparelho e os quatro apareceram em primeiro plano. A sequência do filme me mostrou uma técnica muito aprimorada de sedução, onde as moças com seu jeito delicado, mas com uma segurança um tanto assustadora os levou ao clímax praticamente fazendo-os implorar por algo mais íntimo. Desliguei o monitor quando entravam nos quartos que havia sido preparado para eles.

– A senhora não ficou curiosa, bisa?

– Menino… Você não acha que é muito novo para essas coisas?

– Mas bisa, eu já sei de tudo…

– Quando for mais velho lhe darei o código da fita e você poderá assisti-la integralmente, tá bom?

– Vamos continuar…

– Não fique zangada, bisa…

– Não estou zangada, meu bem… Vamos continuar?

– Tá bom…

– Lembro-me que ficara muito preocupada com os próximos movimentos. Nunca havia presenciado aquilo que fora proposto e tinha minhas duvidas quanto sua veracidade. Olhara bem para as meninas tentando encontrar algo em sua pele que comprovasse tudo que ouvira e nada encontrara. Elas estavam rindo e fazendo pilhéria dos homens, contando algumas passagens realmente hilária, mas eu não conseguia tirar meu pensamento do que ia acontecer. Seria possível? Seria possível os homens de Primicia ter alcançado tamanho avanço tecnológico?

– João surgiu sério a porta olhou para dentro e nos cumprimentou com um volteio de cabeça. Percebendo a descontração emitiu um som indefinido pelo canto da boca e nos convidou a ir ter com ele. Estava acompanhado dos visitantes que me sorriram cumplices. Enquanto caminhávamos ouvi os comentários entusiasmados sobre a viagem e alguns sugeriram a possibilidade de lucros astronômicos quando o equipamento fosse colocado á venda. Estavam subjugados. Sentira como se uma mão invisível tirasse o enorme peso que esmagava meu espírito apesar da ansiedade pela demonstração que se anunciava.

– Chegamos à porta da sala esterilizada e João tocou sua borda fazendo-a deslizar longitudinalmente em duas partes, uma subindo e desaparecendo acima de nossas cabeças e a outra descendo sumindo sob nossos pés. Fiquei impressionada com o conhecimento de João. Percebia-se pelo seu rosto concentrado que faltava pouco para se tornar um homem da caverna.

– O ambiente ao qual adentramos era sufocante. Excessivamente limpo e branco. A porta foi fechada hermeticamente e o ar substituído com um silvo baixo e agudo. Continuávamos com nossos trajes e não passamos por nenhum compartimento de limpeza e por um momento estranhei até me lembrar de que já havíamos nos esterilizado na chegada a lua. Todos, inclusive eu mesma, ficamos calados admirando os equipamentos distribuídos pela sala. Dois homens vestindo roupas muito alvas nos esperavam e nos cumprimentaram silenciosos.

– Sentamo-nos em cadeiras colocadas em semicírculos sobre um tablado, a pedido de nosso anfitrião – que era o papel que João passara a exercer naquele episódio porque nada me contara querendo me surpreender com o espetáculo. E conseguira não posso deixar de concordar. Ficamos esperando enquanto ele se reunia aos dois técnicos e as duas meninas que nos olhavam e sorriam expectantes.

– Sem nenhum aviso as luzes diminuíram quase até apagar-se totalmente e um facho de luz fria iluminou o local que momentos antes os cinco confabulavam. Em seguida as duas meninas se colocaram sob a claridade e começaram a se despir.  Quase que imediatamente pensei levantar, mas me segurei lembrando o motivo da teatralidade. Os comentários dos homens, alguns bem vulgares, surgiram a minha volta. Agradeci a escuridão que não permitia que vissem o rubor de minha face.

Aos poucos fui percebendo a beleza do espetáculo e relaxara. As meninas eram lindas construídas especialmente para o deleite masculino. A pele lisa e bronzeada com pequenas marcas no busto e nas ancas por falta de exposição ao sol aparentava terem acabado de sair da areia de alguma praia paradisíaca. O cabelo brilhante a boca úmida, pintada de carmim, a cintura fina, as coxas grossas, o busto farto, tudo estava na medida certa para o prazer do olhar masculino. Elas ficaram eretas levantaram o braço noventa graus em relação ao corpo e olharam para nós com dois olhos brilhantes e sorridentes. Todos esperavam com a respiração em suspenso.

– De repente os especialistas se aproximaram e sem preambulo começaram a apalpar o corpo das moças. Os dois homens que tinham criado um vínculo com elas horas antes ameaçaram se levantar agressivos. João esperando essa reação se aproximara e fez um gesto firme indicando que não deviam interferir. Sentaram-se de má vontade resmungando algo em sua língua natal que não pude compreender. Os outros riam e faziam comentários entre si excitados

– Inesperadamente o assistente que estava mais próximo retirou o braço do ombro da moça que estava mais ao centro da luz e nos mostrou. A comoção percorreu a plateia e sons variados de espanto chegaram a meus ouvidos. Mesmo estando esperando levei um choque e quase cai da cadeira.

– O desmonte foi total. Um braço depois do outro, os seios, as pernas que foram divididas, coxas para um lado e o restante para o outro. A bacia fora arrancada com algum esforço sobrando o tronco, o pescoço e a cabeça que foram divididas em seguida. O liquido vermelho que saia de seu corpo era sugado por um tubo manuseado pelo outro técnico que não deixava perder nenhuma gota. O cabelo e os olhos foram retirados e colocados em recipientes que os acondicionavam perfeitamente. O rosto fora aberto e separado da cabeça deixando ver em seu interior um material silicioso na cor cinza esbranquiçado que refletia muita luz. Nenhum fio. Nenhum chip. Nada parecia transportar a informação necessária para dar vida aquela menina.

– A outra apenas esperava olhando com tranquilidade sua companheira ser desmontada e colocada sobre um carrinho coberto com um material esponjoso que assegurava a integridade das partes.

– Os visitantes ficaram tão impressionados que não conseguiam ficar quietos. Alguns se levantaram e caminharam pela sala enquanto outro abaixava a cabeça ou outro ainda batia no rosto furiosamente. Os dois que estiveram com as moças vomitaram e choraram copiosamente. Fora um espetáculo impressionante de se ver mesmo para alguém que sabia o que ia acontecer, assim como eu, e que acabara de rir e conversar com elas.

– Enquanto o assistente empurrava o carrinho até a outra sala para ser remontada, o técnico pedira para a segunda garota se posicionar mais a direita de onde estava ocupando o lugar que fora de sua amiga e começara o mesmo procedimento, terminando com  um monte de partes sobre o balcão de metal reluzente próximo, onde depositara o material conforme ia retirando da androide.

– Momento depois João acendeu a luz totalmente para quebrar o clima que fora criado, esperou as peças serem levadas para a outra sala pelo ajudante e se posicionou frente a plateia.

– É isso! – Falara firme olhando-nos nos olhos – Acredito que não preciso dizer mais nada sobre o potencial tecnológico que temos nas mãos. E essa demonstração é apenas uma gota no imenso oceano de conhecimento que temos em nosso poder. Sabemos como funciona a política da superfície e sabemos o quanto a ajuda de todos vocês vai nos ser valiosa. Espero poder contar com todos… Agora vamos fazer uma pausa e voltaremos a nos reunir ás quatorze horas para finalizarmos nosso consórcio. Até lá fiquem a vontade para nos procurar. Estamos aqui para esclarecermos e atendermos qualquer pedido que venha facilitar a cooperação mútua.

– Ouvindo-o percebera o quanto João tinha aprendido nesses últimos dias. Tornara-se um político hábil. Lançara a isca com tamanha sutileza que ninguém poderia acusa-lo de suborno. Compreendera que ainda precisava usar as ferramentas do velho sistema. E a usara com sabedoria.

Continua no próximo capítulo…

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