Já nasci haicai

2022 tem sido fértil em livros. Em seis meses, lancei três obras. Uma amiga me apelidou de Máquina de Escrever. Confesso que fico até constrangido em, depois de divulgar o Palavrório e o Dicionaro, o Dicionário de Bolso, voltar aqui para dizer: saiu mais um!

Na verdade, estou longe de ser uma Olivetti ou uma impressora matricial. Aconteceu o seguinte. No começo desse ano, enviei Palavrório para a chamada de poetas da editora Urutau. Quase na mesma época, inscrevi Senryu & Me (saindo do prelo agora), na chamada de bardos da editora Laranja Original. E não é que fui escolhido, pelas duas, para ter os livros editados?

Ali por agosto, com a aproximação das eleições, achei que seria uma boa oportunidade para lançar os verbetes do Dicionaro em livro. Eles saíram, durante um ano, no jornal Plural, de Curitiba. A ideia é que ajudassem a trazer luz ao pleito mais intrincado da nossa História contemporânea. Conversei com a editora Debora Ribeiro, da Urutau, e ela topou, na hora, colocarmos o projeto nos trilhos.

Segurei o lançamento de Senryu & Me até onde pude. Contudo, não deixaria de inaugurá-lo amanhã na Feira Miolos, da Biblioteca Mário de Andrade, em São Paulo. 

O senryu, para quem não conhece o termo, é um gênero de haicai profano. Um poema japonês curto, de três linhas, num total de 17 sílabas (ou não, vai do freguês, o Guilherme de Almeida que nos perdoe). Tende a ser mais sobre as fraquezas humanas, enquanto o haicai versa sobre a natureza. O senryu é cínico, ou de humor sombrio, enquanto o haicai é mais sóbrio. 

Ao me aprofundar no tema, com o auxílio luxuosíssimo do haijin Rodolfo Witzig Guttilla, fui percebendo que o senryu tinha tudo a ver com minha ligação ao humor e às narrativas breves. Aliás, é melhor o próprio Guttilla falar do Senryu & Me do que eu. Vejam o que ele diz na quarta capa do livro:

 

“Carlos Castelo é um cara de muitas vidas. Músico, letrista, artista e performer, mais recentemente foi cavalo de um haijin (poeta de haicai) de produção transbordante (a propósito, não causará espanto se for convocado a compor a delegação brasileira de Sudoku nas próximas Olimpíadas). Nos anos 1980, no subsolo do Teatro Lira Paulistana, arrebentou a cena musical paulistana com o conjunto Língua de Trapo, do qual foi um dos fundadores e maior compositor. Em Senryu & Me, Carlos pratica a concisão dos três versos, emulando o senryu, poema satírico japonês. Primo-irmão do haicai, deve ser lido de uma única vez, sem muita reflexão crítica, ou meditabunda – como diria Millôr Fernandes. Talvez, como um poema-piada, de Oswald de Andrade.”

O professor-titular de literatura brasileira, da Universidade Federal do Espírito Santo, Wilberth Salgueiro, nome determinante do humor na poesia, também deu o seu parecer na orelha da publicação: 

“Fala, Senryu! Sim, porque, se de um senryu eu rio,

um senryu também fala sério. Vejamos: “país na

barbárie / e vocês aí / reclamando da cárie”, ou

“o meu verso é guerra / um fim ao clichê / que

gruda como chiclé”. Onde o riso, onde o siso?

Afora isso, os poemas de Carlos falam de deus e

de todo um mundo, de Bashô a Cabral, de Buda 

a Caetano. Confira, leitor, e ria do que aqui seria-

mente se encastela!”

Para completar, a apresentação ficou a cargo de Zuca Sardan, um dos maiores representantes da poesia marginal brasileira, cuja obra, como a minha, é marcada pela irreverência e ironia. 

Convido todos a irem no sábado (5.11), à Feira Miolos, a partir das 15 horas, através destes versos:

sou Carlos Antônio

de Melo e Castelo Branco

já nasci haicai

Em tempo: às 17 horas, estarei no estande da Urutau autografando o Dicionaro, o Dicionário de Bolso. 

Sobre Carlos Castelo 49 Artigos
Jornalista, poeta, humorista profissional diplomado. Um dos criadores do grupo musical Língua de Trapo.

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