Mascaramento por Alexandre Lúcio Fernandes

illustration of man getting out of darkness through a light door, surreal concept black and white

 

por Alexandre Lúcio Fernandes

Há podridão nos escuros corredores do mundo, sobretudo no das pessoas.Há um inverso que se instala roubando valores, memórias e sensos racionais. Acumulam-se detritos que desviam passos, desajustam pensamentos e a capacidade cognitiva de distinguir o certo do errado. Tampouco sabemos o caráter das motivações que desvinculam os atos do seio humano. Ao tentar saber, apenas imaginamos. Existe sempre uma maldade ponderada, escondida em eufemismos tolos, numa demonstração do quão o homem é capaz de não ser, de desvirtuar tudo o que o torna.

Há um apelo arraigado às pequenas mentiras, paranoicas motivações ligadas a grandes representações. É um cerco que reitera o desapego latente da fraca massa alienada, subentendida por falsas justificativas, sentimentos omitidos por uma deturbada moral de bom senso e honestidade.  Fazem-se pinturas incoerentes de uma imagem que aflora aos olhos, contrariando o que se intercala no cedente, vilão inconsciente do seu lado cruel, herói dormente sob uma face que se alastra furtivamente, quase imune à suspeitas. Porque quem engana, também engana a si.

Ocorre de haver quem se apegue a torpes sensações, a disfarces de gestos e pele, a golpes existenciais onde se criam uma defesa em forma de personagem. Difícil saber do alcance dos movimentos humanos, de atos desprendidos de uma matriz que oriente os eixos comportamentais e simplesmente ataque as fronteiras alheias sem ter senso do efeito devastador. Já dizia Freud, que o ser humano não é movido apenas por sua parte consciente. O confronto entre os extremos cônscios da mente é que reflete a fragilidade humana em ser imperfeito, que o torna tanto o pior quanto o melhor.

O mascaramento afugenta o rosto, captura o semblante e o sentimento de quem o encara. Numa fração, verdades escoam pelo ralo. Como explicar o porquê de algum aspecto sobrepujar o ego e quaisquer valores morais filtrados pela consciência? O escopo humano em se forjar é uma armadilha que catapulta sentimentos e estilhaça a nobreza da fé, retendo a crença e a confiança instalada nos olhos inocentes. Não se esmiúça, muito menos adentra, sem percorrer as divisas obscuras. Há camadas, muitas facetas que envolvem o humano. Há escolhas e caminhos, muitas vezes sombreados pela declinada inconsciência. Mas não se cura uma condição inerente de quem já, inadvertidamente, elegeu seus desígnios.

Ser humano é padecer de seus limites. E nem todos discernem o equilíbrio moral de seus mascarados atos, simplesmente por serem escravos da imperfeição, alunos de uma rígida vida que o confrontam com bifurcações desconhecidas. Acabam transbordando sem ter noção de seus efeitos. Evadem-se numa insuspeita caracterização, por uma via única, com algum intento misterioso de encobrir pele sombria com pele sombria. Mascarar é, enfim, roubar e desistir de si próprio, sem realmente conhecer o que o faz ser quem é.

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