Nasce um herói – Capítulo I

Por Milton T. Mendonça

A propósito: Se as mulheres não existissem o mundo seria plano e sem cor. Elas trazem luz e profundidade ao nosso universo.

 

Livro I

Nasce um herói

O deserto estava quente e abafado quase não se podia ver a curva do horizonte. Os soldados babilônicos aproximavam-se para o ataque na esperança de afugentar os inimigos que tentavam invadir sua cidade. O general persa montado no cavalo negro ao lado do rei Ciro conhecia o final daquela batalha que se anunciava. Já vira o exercito persa receber o impacto do inimigo fechado no bloco compacto que fora criado para despedaçar a fúria desorganizada de seus oponentes. E o resultado dessa vez não seria diferente.  A batalha não duraria muito.  Logo estaria tomando vinho no salão do trono da bela cidade e poderia ver finalmente os segredos que alguns diziam se esconder dentro de seus muros. Guardados por egotismo de Nabucodonosor.

O general olhou de soslaio para seu rei e sua memória o levou de volta á casa materna. O pequeno sitio onde passara uma infância tranquila e feliz as voltas com plantações de frutas e legumes. Repassou pela milésima vez a história contada por sua mãe de como Harpago o serviçal do rei da Média, Astiage, havia entregado seu irmão mais velho, Ciro, aos seus cuidados. Lembrou-se da reação de Ciro ao saber que seu avô o queria morto e do medo que sentira quando seus pais verdadeiros, o rei Gambise, da Pérsia e sua rainha Mandane vieram buscá-lo muitos anos depois ao descobrirem seu paradeiro. Olhou o céu azul e bendisse o deus que lhe trouxera sorte ainda no ventre de sua mãe.

O estrondo de metal se chocando tirou-o de seu devaneio. Voltou sua atenção para a batalha e tudo avermelhou. Os gritos de dor e raiva invadiu seu ouvido. Esperou a confusão de corpos sendo despedaçados no primeiro contato entre os exércitos diminuir e a dança se iniciar num corpo a corpo feroz e belo. Sentiu a sensação de poder tomar conta do seu peito e se espalhar pelos braços e pernas. Esmagou o cabo da espada com força e virou-se para seu rei.

– Não demorará muito dessa vez.

– É verdade. Vê os flancos descobertos? Envie sinal para a cavalaria atacar pelos flancos.

Aquêmenes puxou a rédea de seu corcel e saiu da formação galopando em direção á cavalaria. Estava eufórico. Precisava instigar pessoalmente os soldados á luta. Deixaria os sinaleiros sossegados por enquanto.

– General!

Exclamou freando o cavalo violentamente.

– Leve seus homens pelos flancos e ataque maciçamente. Quero jantar no palácio hoje à noite.

O general Spargapise gargalhou e se dirigiu aos soldados.

– Estão ouvindo seu comandante?

Perguntou alegre. O som de sua voz reverberou pela multidão ansiosa.

– Vamos deixá-lo do lado de fora dos muros da cidade? Ao relento?

– Não!

O grito em uníssono ressoou até Ciro.

– Então ao ataque!

Gritou e retirou a espada da bainha saindo a galope em direção à batalha.

A luta foi violenta e rápida. Antes do sol se por Ciro e seu séquito entrava pelos portões da mais bela cidade do mundo: Babilônia. A cidade misteriosa e cheia de encantos que tinha o poder de atrair homens dos lugares mais longínquos. Possuía escravos entre os povos mais exóticos e os segredos mais bem guardados. Sua fama corria o planeta com o vento.

Os dois reis mais poderosos da terra se encontraram na sala do trono enquanto a noite estendia seu manto de sombras sobre os corpos mutilados, espalhados pelo palco da peleja, fechando o capítulo daquela história que deixava de existir nessa dimensão para renascer na imaginação dos poetas e dos místicos transformando o episódio em lenda.

A verdade, porém fora esquecida. Ciro após executar Nabucodonosor deixou seu irmão de criação, Aquêmenes, no trono da cidade e voltou ao seu palácio para planejar novas conquistas.

Aquêmenes dando continuidade a política de Ciro libertou os escravos hebreus e através desse povo misterioso e rude descobrira que Nabucodonosor escondera nos subterrâneos do palácio algo muito secreto e poderoso. Procurara em vão por vários meses em todo palácio sem nada encontrar. Instigado pelos murmúrios daquele povo andrajoso e comedor de alho vasculhou o reino em busca de informação encontrando escondido nas cavernas dos montes que circundavam a cidade o antigo mágico do rei deposto, que prevendo a queda de seu amo fugira esperando ser encontrado e recolocado no antigo posto sob a nova ordem.

Ao ficar frente a frente com Aquêmenes se jogou ao chão de joelhos e implorou por sua vida, olhando dissimulado por entre a cabeleira desgrenhada. O que ele viu sentado no antigo trono de seu mestre não foi o inimigo esperado, mas o guerreiro que poderia ajudá-lo desvendar o segredo há muito cobiçado.

Apoiado à cimitarra numa postura inequívoca de poder o conquistador o olhava com a expressão pétrea de alguém que busca algo, mas ainda não se decidira como tomá-lo.

– Grande rei!

Exclamou encostando a cabeça no chão, sentido o frio do contato com a pedra lavrada.

– Peça e serei aquele que lhe entregará. Mesmo que para isso tenha que revolver o lago de metal líquido dos deuses para encontrar o que deseja…

Ouvindo aquilo Aquêmenes piscou os olhos espantado e levantou se aproximando do prisioneiro.

– Levante-se mágico.

– O que sabe do que preciso? Alguém já lhe informou do que procuro?

O homem ergueu cabeça e olhou seu captor desviando a vista para além dele em sinal de temor.

– Peça o que quiseres senhor e eu providenciarei.

– Retornarás ao seu antigo posto se me mostrar o maior segredo do rei!

Exclamou firme olhando-o fixamente.

O mágico empalideceu e pendeu a cabeça batendo com força no chão duro. Aquêmenes agarrou-o pelos ombros e o levantou mantendo-o preso entre as mãos, curioso.

– O que sabe sobre o tesouro escondido?

Perguntou próximo ao seu rosto.

É proibido! Ninguém pode chegar perto daquela porta sem perder a cabeça. Somente o rei… Somente o rei pode se aproximar.

O mágico gaguejou assustado.

– Eu sou o rei! Exijo que me leve ao tesouro imediatamente.

Aquêmenes falou irritado o soltando fazendo-o perder o equilíbrio.

– Guardas!

Gritou irado e imediatamente dois soldados apareceram ao seu lado.

– Leve esse homem e faça-o falar.

O mágico se encolheu de medo e antes que os soldados lhe colocassem as mãos se ajoelhou e pediu piedade.

– Senhor, senhor! Tenha piedade! Levá-lo-ei a sala do tesouro, mas não sei como abri-la e nem o que contém.

– Levante-se e me mostre.

Aquêmenes falou ríspido e caminhou para fora da sala do trono.

O mágico levantou-se cambaleando.

Caminharam por corredores escuros e desceram escadas íngremes até alcançar o aposento mais distante e profundo do palácio. O mágico levantou a tocha e mostrou a parede nua á sua frente.

– É aqui.

Falou apontando a parede.

– Como? E a porta?

– Não sei. O rei não permitia que ninguém o acompanhasse… Ele apenas entrava enquanto alguns serviçais esperavam lá adiante.

Apontou para o final do corredor onde se dobrava para a esquerda, àquela hora invisível pela escuridão.

– Como você tem certeza que é aqui?

– Um dos serviçais antes de ser morto me indicou o caminho confirmado pelos sinais na poeira.

Iluminou o piso lhe mostrando as marcas deixadas no pó.

– Ele assassinava os serviçais que o acompanhavam?

– Todos.

Eleazar Bem Yair estava temeroso um novo rei havia tomado o poder. Apesar da promessa de liberdade temia pela sua família. Sob sua liderança havia ajuntado todos os pedreiros e construtores da babilônia em uma sociedade secreta com o propósito de guardar o conhecimento adquirido em um só lugar evitando que desaparecesse com o seu criador, situação comum entre diversas profissões. Fazendo isso, costumava dizer aos novos acólitos, poderia passar a informação para a nova geração sem ônus obrigando-os assim retribuir a distinção com as novas técnicas inventadas, aumentando o acervo e deixando de se perder no tempo.

O costume dos governantes em matar o construtor que edificasse algo insólito ou secreto fizera desaparecer algumas técnicas impossíveis de serem reconstituídas. Seu pai Eahur Bem Yair planejara a base da sociedade, mas infelizmente fora morto por Nabucodonosor assim que terminara a construção secreta onde estava guardado o maior tesouro jamais visto por um ser vivo. Não antes, porém de deixar anotado nos anais da sociedade seu projeto e os segredos que o envolviam nascendo assim algo além de apenas uma biblioteca.

Ao longo dos muitos anos de sua morte pouco se falou sobre os mistérios. O rei punia com a degola qualquer menção ao seu tesouro. E aqueles dois ou três que faziam parte da sociedade secreta e sabiam do que se tratava temiam abrir a boca. Apenas murmuravam que o tesouro era uma manifestação do Deus único e que não demoraria em ser resgatado por seu emissário.

Eleazar Bem Yair fechado com suas ânforas onde guardava os pergaminhos contendo toda ciência acumulada procurava aquele onde seu pai imprimira seu conhecimento.  Estava perplexo com a novidade. A libertação de seu povo era o sinal de que o enviado do Deus único estava ás portas. E esperava, não sabia por que, que o rei o chamasse ao palácio e isso o deixava irascível e resmungão. Temia pela sua família. Temia pelos seus colegas. Temia pelos pergaminhos. E a demora em encontrar o que procurava o deixava quase louco.

Gautama, o mágico entrou em seu antigo aposento foi até a lareira e mexeu entre o carvão. Estava raivoso e resmungou um impropério amaldiçoando o novo rei.

– Como descobrira?

Perguntou alto às paredes.

– Maldito! Depois de tanto sacrifício não adiantou nada.

Retirou de entre a fuligem dois frascos e segurou-os nas mãos, satisfeito.

– Agora está por minha conta não deixarei de resgatá-lo. Afinal foi meu mestre quem o descobriu. O maldito rei não tinha o direito de escondê-lo.

Deixou o aposento e caminhou por corredores sombrios até alcançar os estábulos saindo em céu aberto. Os cavalariços assustados com sua presença fugiram se escondendo nas sombras. O mágico tinha fama de malvado e vez ou outra pegava algum menino ou menina para seus experimentos e quando tinha a sorte de voltar vivo estava de tal maneira estropiado que era sacrificado e jogado aos porcos.

Caminhou apressado por entre as galinhas, atravessou o portão maciço vigiado pelos guardas e desceu a encosta em direção ao rio. Esperava encontrar o material necessário para recriar a fórmula de seu mestre. Ele garantira que era a mais poderosa das armas, mas nunca tentara criá-la duas vezes por medo de destruir o palácio.

– Pobre coitado.

Rira com escárnio ao se lembrar do homem.

Aquêmenes estava chocado com a informação recebida do homenzinho que se dizia mágico. As duas noites anteriores foram longas. Não conseguira pregar os olhos.

– O que se escondia atrás daquela parede?

Perguntou-se inquieto sentado no trono a espera do escriba do antigo rei.

Bardiya surgiu na porta escoltado por dois soldados e se jogou no chão ao se aproximar do trono.

– Tenha piedade, senhor, de um pobre homem cujo único pecado é servir.

Aquêmenes levantou-se e caminhou vagarosamente em direção ao homem ajoelhado colocando o pé em seu ombro comprimindo seu corpo contra o piso, mantendo-o firme.

– Como posso abrir a sala do tesouro?

Perguntou ríspido.

– Tesouro, senhor?

Bardiya perguntou trêmulo.

– Sim! O tesouro da sala secreta…

– Espero que o escriba do rei seja esperto o suficiente para saber do que estou falando.

Aquêmenes se dobrou ficando quase próximo à orelha do escriba. Murmurou as palavras colocando na voz o tom de crueldade aprendido com Ciro, reconhecido como um articulador sagaz e astucioso.

Sentiu sob os pés o corpo trêmulo de Bardiya e completou:

– Poderá ter seu cargo de volta se me disser o que quero saber.

– Grande rei talvez possa ajudá-lo.

Aquêmenes ouviu suas palavras e sorriu dando ás costas ao escriba.

– Levante-se e diga!

Ordenou firme enquanto voltava a sentar-se no trono.

Bardiya se arrastou até próximo ao trono e encostou a testa no piso elevando a voz.

– Existe um hebreu entre  o povo libertado que pode ter a informação que deseja.

– Quem é esse homem?

– É o hebreu líder dos pedreiros

– Traga-o imediatamente.

O homem saiu apressado de diante do trono cruzou os corredores e saiu do palácio acompanhado de alguns soldados. Subiu no cavalo e percorreu o campo a galope entrando no aglomerado de tendas coloridas onde os hebreus habitavam.

Eleazar bem Yair ouviu o tropel dos cavalos em disparada e saiu á porta esperando ver adolescentes em mais uma de suas disputas intermináveis se deparando com o grupo de soldados escoltando o antigo escriba do rei. Ficou observando intrigado a comitiva se aproximar. Aquele momento de apreensão havia passado. Não tinha porque o rei saber dele. Fora o que sua mulher dissera…

O grupo estacou frente sua tenda fazendo os cavalos bufar pelo esforço.

– Estamos procurando os mestres dos pedreiros!

Badyia exclamou autoritário.

– Porque o procuram?

– Viemos buscá-lo por ordem do rei.

– O que o pobre homem fez?

Eleazar perguntou sentindo o frio do medo percorrer sua espinha de alto à baixo.

– Isso não importa. Sabe onde podemos encontrá-lo?

– Acaba de encontrá-lo.

O mestre dos pedreiros se empertigou mostrando uma coragem que não sentia.

– Venha conosco!

O escriba ordenou forçando o cavalo que se voltou e seguiu trotando em direção ao palácio.

Eleazar Bem yair seguiu-os correndo chegando ao destino exausto e cheio de pó. Sentou-se na escadaria na entrada do palácio e recuperou o fôlego enquanto  o escriba  desmontava e entregava sua montaria para o servo que veio correndo assim que o vira.

– Vamos!

O homenzinho tocou sua cabeça ao passar entrando no ambiente ameno. Levantou-se com esforço e o seguiu cambaleante.

O rei esperava ansioso andando de um lado para o outro na sala do trono. Chegou á janela olhou o horizonte e viu a comitiva se aproximando com o hebreu correndo atrás dos cavalos. Ficou observando por algum tempo ansioso. De repente num ímpeto de raiva voltou-se e caminhou até o trono sentando-se em seguida, impotente.

O mágico mexeu pela milésima vez o caldo no caldeirão enquanto com a outra mão apertava e soltava a bexiga de carneiro sugando o líquido marrom que surgia em forma de bolha.

Pendurou a colher de madeira no gancho e se aproximou da bancada com vários recipientes alguns com liquido outros com minerais moídos ou vegetais amassados. O cheiro rescendia nauseabundo. Adicionou o conteúdo da bexiga de carneiro em quantidades diferentes em cada recipiente mexeu com cuidado cada um deles e colocou misturando tudo vagarosamente em pedaços quadrados de pele amarrando com força. Depositou-os dentro de uma sacola e saiu  para o pátio. Olhou em volta desconfiado, mas não viu ninguém observando ou parado na proximidade. Voltou para dentro pegou a bolsa passando-a pela cabeça cruzando transversalmente sobre o peito retornou ao pátio contornou o estábulo e seguiu o muro até o portão passando por trás do guarda sem ser visto desaparecendo no bosque.

Percorreu a margem do rio até alcançar uma pedreira onde se abaixou retirou um dos pacotes da bolsa colocando debaixo de uma enorme pedra de granito.

O estrondo deixou-o surdo e a poeira alcançou-o do outro lado do rio. Quando conseguiu recuperar a visão a pedra onde depositara o volume havia desaparecido. Ficou olhando para o local da detonação trêmulo e depois de alguns segundo de estupefação caiu na gargalhada. Estava muito contente.

– O velho estava certo. É apavorante. Poderia destruir o castelo com algumas dessas.

Falou consigo mesmo se levantando. Bateu as mãos na roupa surrada numa tentativa patética para retirar o pó que se misturara a fuligem de anos á beira do fogo voltando a se sentar na grama ainda trêmulo.

Os dois homens entraram na sala do trono e se jogaram no chão com temor. Aquêmenes se endireitou no trono e exclamou irritado:

– Aproximem-se!

Arrastaram-se subservientes até próximo ao tablado onde o trono fora posto com a intenção de elevá-lo acima do homem comum e esperaram com o rosto no piso frio.

– Hebreu!

Aquêmenes exclamou.

– O que sabe sobre o tesouro de Nabucodonosor?

O tom de voz saiu de suas cordas vocais com o tremor peculiar de um coração ansioso, percebido de imediato pela inteligência aguçada de Eleazar bem Yair.

– Tesouro, senhor?

– Sim! O tesouro escondido atrás da parede do calabouço…

– Bem… Meu pai construiu uma edificação no palácio alguns anos atrás e nos deixou algumas anotações, mas não sei muito mais do que isso. Posso procurá-las se assim o desejar…

– Vá, vá! Traga-me uma maneira de encontrar o meu tesouro…

Antes de terminar a frase voltou-se e saiu da sala do trono por uma porta lateral desaparecendo no interior do palácio. Eleazar Bem Yair levantou-se e olhou em volta indeciso.

– Deve ir agora!

Badyia exclamou á suas costas.

– Traga a informação ou perderá a cabeça.

Deixando-o sozinho em seguida.

O mágico dominado pela euforia atravessou o rio e percorreu o caminho de volta ao palácio girando o corpo periodicamente e olhando a pedreira maravilhado com o resultado de sua experiência.

– Incrível!

Exclamou pela centésima vez.

Ao virar a curva e começar a subir o elevado percebeu os soldados que vieram averiguar o barulho e por instinto se escondeu entre as folhagens ficando imóvel enquanto  os via descer o barranco escorregadio resmungando e maldizendo a sorte.

Esperou que desaparecesse de vista e subiu correndo o restante do aclive entrando afobado no pátio. Parou por um momento e respirou fundo tentando acalmar o espírito. Olhou em volta disfarçadamente e nada viu que o preocupasse. Sacudiu a cabeça sorriu entre dentes e retornou ao seu alojamento.

Eleazar Bem Yair estava sofrendo. Sentado nas almofadas em sua tenda tinha o alma atormentada. O momento tão esperado havia chegado e suas duvidas não tinham sido apaziguadas. Desenrolou o pergaminho novamente e releu-o pela milésima vez.

– O que será que está escondido entre aquelas paredes?

Perguntou-se curioso.

– Seguiu o dispositivo, com o dedo, engenhosamente desenvolvido para abrir a porta escondida e sorriu encantado.

– Você era um verdadeiro mestre, meu pai!

Exclamou tocando o coração com a mão espalmada.

De repente levantou a cabeça e prestou a atenção ao longe. O tropel de cavalos não era sua imaginação. Vinham buscá-lo. Não tinha mais tempo para duvidas. Levantou-se e se dirigiu á porta e esperou.

Aquêmenes não conseguira esperar mais. Estava ansioso como nunca estivera antes. Sua curiosidade o corroía por dentro deixando tudo mais sem sentido ou propósito. Chamou seu escriba e ordenou que fosse buscar o hebreu.

– E me traga as anotações!

Exclamou antes de despachá-lo sugerindo que sua cabeça estava em risco deixando o homenzinho branco como cera. Esperou-o sair e depois de algum tempo moveu a cabeça de um lado para outro enérgico como se afastasse pensamentos incômodos aproximou-se da janela e viu o escriba vestido em roupas coloridas á frente dos soldados, galopando como se animais ferozes os perseguissem.

Eleazar Bem Yair viu-os se aproximar e saiu da tenda. O cavalo roncou se jogando para trás lançando saliva e suor quente no rosto do hebreu que não se moveu. Ficou estático como se esperasse ser atropelado.

– Encontrou o que veio buscar, hebreu?

O escriba perguntou como se nada mais importasse.

– Encontrei…

Respondeu sucinto.

– Siga-nos, então.

O homenzinho ordenou sorrindo aliviado.

Seguiram caminho pela estrada poeirenta em direção ao palácio.

O mágico deitou em seu catre rindo alto. Ainda não conseguira sair do espanto que a explosão lhe proporcionara fazendo-o esquecer momentaneamente do seu propósito. Pegou a bolsa de couro e retirou de dentro o que restou de seus volumes e mirou-os alegre.

– Como utilizá-los sem derrubar o castelo?

Perguntou-se balançando o embrulho seguro pela tira de couro.

– Hoje irei até onde está a porta… Ou a parede para sondá-la. Amanhã colocá-la-ei abaixo e levarei embora comigo o tesouro.

Levantou-se de um pulo e saiu para o pátio. Caminhou tentando mostrar uma tranquilidade que não sentia até se ver fora das vistas daqueles que passavam. Esgueirou-se para a sombra de um portal numa velocidade impressionante demonstrando experiência no ato de desaparecer. Atravessou os corredores sem ser visto e desceu as escadas em direção ao calabouço.

Chegou à parede e traçou com a tocha um arco de um lado a outro vasculhando toda a face de pedra. Esquadrinhou com os dedos as reentrâncias encontradas e estabeleceu os pontos prováveis para colocar os volumes. Bateu  o punho com força e sentiu a solidez. Não tinha dúvidas precisaria de dois, talvez três pacotes de mistura fétida. Murmurou para si mesmo.

Badyia entrou na sala do trono com o pergaminho nas mãos. Decidira que ele seria o portador da informação tão desejada e esperada por seu mestre. Por experiência sabia que o portador compartilhava da  mensagem para o bem ou para o mal. E essa faria com que fosse lembrado com benevolência.

Aquêmenes os esperava de pé no meio da sala do trono. Sua ansiedade era perceptível a quilômetros de distância e Badyia agradeceu aos deuses por ter pensado em trazer ele próprio o pergaminho, no momento que o viu.

Assim que se aproximou Aquêmenes tomou-lhe o invólucro das mãos e desenrolou lendo avidamente seu conteúdo. Depois de alguns segundos concentrado na leitura levantou os olhos e mirou o escriba atônito.

– Não entendo nada do que vejo!

Exclamou decepcionado.

O escriba observando seu descontentamento pediu licença se curvando até próximo ao solo e saiu da sala do trono voltando minutos depois acompanhado de Eleazar Bem Yair.

Aquêmenes os esperava sentado desolado no trono. Levantou-se rapidamente quando os viu cruzar a grande porta se esquecendo das formalidades que seu cargo exigia. Estava completamente tomado pela ansiedade de conhecer o tesouro do antigo rei.

Entregou o pergaminho nas mãos do hebreu e esperou que abrisse e lhe fosse explicando os desenhos. Ficou imensamente impressionado com o dispositivo, mas  não encontrou o que buscava

– E o tesouro? Não vejo nada sobre o tesouro.

-A única referencia sobre o tesouro é que ele pertence ao Deus único e deve ser devolvido.

– Deus único? Vocês hebreus são muito complicados. Quero que abra a porta.  Resolva isso e abra a porta para mim!

Virou-se ao completar a frase e se afastou. Não estava interessado em deuses. Tinha seu deus e ele já era muito exigente. Outro deus somente iria atrapalhar sua vida. Pensou consigo mesmo olhando pela janela e observando as pessoas lá embaixo.

Eleazar Bem Yair requisitou dois escravos e as ferramentas necessárias. Iria entrar na sala na manhã seguinte. Naquela noite sacrificou a Deus seu melhor carneiro ungiu as ferramentas com o sangue fresco e queimou a carcaça sobre o altar sob a direção do profeta.

Fora dormir exausto e acordou com a luz da aurora forçando caminho entre as nuvens densas…

Continua no próximo capitulo.

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