Você aceita uma xícara de chá?

 

Você aceita uma xícara de chá?

Minhas impressões sobre a minissérie Bebê Rena

Bebê Rena é uma minissérie britânica de 2024 com 7 episódios e está na Netflix desde o início de abril.

Estava eu buscando algo interessante para assistir e vejo esse título, mas não me interessou muito, achei que era algo bobo e sem graça. Não assisto séries novas na Netflix por conta desse streaming cancelar (quando não dá ibope) várias séries a partir da segunda temporada, por isso só assisto filmes e minisséries ou séries concluídas. Bebê Rena é uma minissérie e de tanto aparecer em minha tela, na interface do streaming, acabei por aceitar, tipo, não tem tu, vai tu mesmo.
Mas qual não foi minha surpresa ao começar a assistir e constatar que não se pode julgar um livro pela capa, nem uma minissérie pelo título. Realmente pensei que era uma daquelas histórias chatas e cansativas, pelo título, mas foi um ledo engano. Como o protagonista é um comediante, a história apresentou um drama sombrio, indo mais para uma tragicomédia.
A minissérie é baseada numa história real, na verdade a história do próprio roteirista, o comediante escocês Richard Gadd que escreveu a história, a sua própria e interpretou o protagonista que é ele mesmo. Bizarro!
Richard Gadd escreveu a própria história tentando fazer da sua realidade, uma ficção. E para isso, trocou os nomes e alguns detalhes que pudessem ocultar as pessoas envolvidas. Na história ficcional ele é Donny Dunn, um comediante Stand Up fracassado que trabalha como barman num pub de Londres.


Em um momento qualquer em que ele estava trabalhando no pub, entra uma mulher cabisbaixa e triste e senta no bar. Ela é a Marta e não pede nada porque diz que não tem como pagar – Donny então lhe oferece uma xícara de chá como cortesia. E esse gesto generoso fez com que o rosto de Marta brilhasse considerando aquele homem um anjo, ficando muito grata. Que bonito, não é mesmo? Mas Donny, muito em breve terá um profundo arrependimento de ter oferecido aquela xícara de chá. A partir de então, Marta não larga mais do pé dele e vai tomando conta da vida de Donny, tornando-se uma stalker obsessiva. O drama começa a ficar intenso, com uma linguagem angustiante, uma paranoia exacerbada, as cenas e os contextos bem desconfortáveis.
Richard Gadd consegue descrever a sua própria história, tudo que ele passou, de uma forma bem pesada e extremamente dramática. O ator se entrega ao papel, afinal foi tudo o que aconteceu com ele.
Até o terceiro episódio foi dando raiva a passividade dele diante da Marta; depois do quarto episódio a história muda e mostra os seus traumas do passado e aí a gente vai entender o porquê da sua inércia e Codependência em relação a sua perseguidora, que no fundo mexia com seus próprios problemas. Ele nunca tem uma reação plausível diante do que está passando, parecendo ter uma certa conexão com tudo aquilo e com ela.
Não vou entrar em detalhes para não dar nenhum spoiler, mas esta minissérie está causando muitas polêmicas nas redes sociais. A coisa está tão louca que descobriram até quem é a Marta na vida real e ela está processando a Netflix.
É uma produção impactante e Richard Gadd que mostra uma coragem invejável em revelar-se com tanta franqueza, chega a ser desconcertante. E ao interpretar a si mesmo, fica ainda mais carregado e estranho. Ele coloca uma série de temas atuais que circundam a realidade e o mundo contemporâneo, mas não dá soluções e conclusões sobre isso, mostrando o lado humano de forma gritante. E essa inconclusão e inacabamento da condição humana nos deixa ainda mais angustiados e com certa náusea, como já dizia Jean Paul Sartre.

Cuidado ao oferecer uma xícara de chá para algum desconhecido – fica a dica.

Elizabeth de Souza
060524

 

https://pt.wikipedia.org/wiki/Richard_Gadd

 

Sobre Elizabeth Souza 397 Artigos
Elizabeth de Souza é coordenadora e editora do Portal Entrementes....

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