TOP 5 | Melhores Filmes de 2017

por Quênia Lalita

Se tem uma coisa da qual todo ser humano gosta, é a arte de assistir filmes. Pois assistir filmes não se limita a estourar pipoca, abrir a página do Netflix e acompanhar a debandada audiovisual que invade globos oculares e canais auditivos. Cinema sempre foi e sempre será muito mais do que isso, pois cada um de nós possuímos a autonomia de nossos universos particulares, que irá definir a validade de histórias que vemos, ouvimos e sentimos. Às vezes o gênero nem importa – só precisamos de uma parábola mirabolante desenrolando-se diante de nossos olhos, nos teletransportando para outra dimensão por algumas horas.

Afinal, não é essa a graça do cinema: classificar o que é bom ou ruim, pessoalmente falando? Isso mesmo, a classificação de qualquer produto é pessoal. Até os mais badalados críticos de cinema estão, invariavelmente, exprimindo opiniões. Pode ser que os mesmos tenham um jeito mais elegante de fazer observações, confeccionem análises rebuscadas sobre determinados aspectos do enredo, comentem detalhes técnicos invisíveis ao olho nu do espectador menos experiente – ainda assim, continuam sendo meros pontos de vista a respeito da obra-de-arte de outrem.

Mas cá pra nós, um bom filme é aquele que te comove de uma forma complicada de explicar… Talvez você sinta arrepios na nuca? Quem sabe, reflita sobre temas nunca antes alcançados pela sua mente? Quiçá se emociona com algo singelo ou lúdico que te surpreende a ponto de mudar sua visão de mundo? Ou é uma mistura de todas as perguntas anteriores. Então, não é à toa que a cinematografia é considerada uma ciência espetacular: o que é maravilhoso alcança multidões, alcança imensidões, alcança outras galáxias!

E depois desse longo blablablá obsessivo compulsivo cinéfilo, chegou a hora de me apresentar: oi! Meu nome é Lilith, bem-vindo ao meu primeiro post do ENTREMENTES. Permita-me recomendar os cinco melhores filmes que tive o prazer de assistir em 2017 e, me arrisco a dizer, mudaram a minha vida de alguma maneira… Vai que as estrelas estão se alinhando para que você de fato siga uma das minhas recomendações, sentindo uma mudança na sua vida também?

5. A Síndrome de Berlim (Berlin Syndrome, dir. Cate Shortland)

Certos filmes são feitos com o intuito de nos advertir sobre os perigos do que há ao nosso redor, sendo que até a casual e divertida ingenuidade de nossos atos potencializa riscos de nos inserirmos em circunstâncias catástroficas. Situações que, inicialmente, aparentam ser inofensivas, podem ser o extremo o oposto, nos envolvendo em cenários caóticos e assustadores.

Tal fenômeno costuma ocorrer se estamos cegados por entusiasmo e/ou sede de mudança, realizando um sonho, explorando o desconhecido, deslumbrados com as novidades e possibilidades infinitas de um lugar exótico, por exemplo. A Síndrome de Berlim entra para a lista não-oficial de “filmes-alerta” e uma imperdível dissecação de relacionamentos interpessoais entre desconhecidos e sobre a mania inocente que impulsiona tanta gente a confiar em estranhos.

Existem dezenas de longas que abordam a pavorosa temática do sequestro; em sua maioria, baseados em fatos reais, fator que costuma ser um adicional agoniante ao contexto. No caso desta película adaptada de uma ficção escrita pela australiana Melanie Joosten, a ausência de conexão com acontecimentos verídicos não deixa de prender o espectador à história que se desenvolve de modo sedutor, sorrateiro e cru, muitas vezes nos obrigando a quase sentir na pele o que cada personagem vivencia, fazendo d’A Síndrome de Berlim um thriller impressionante.

4. Okja (Okja, dir. Joon-Ho Bong)

A não ser que você tenha vivido numa caverna platônica nos últimos anos, não precisa que eu te informe sobre o BOOM da Netflix na vida moderna: ela está em todo lugar. E dentro de um longo catálogo de filmes e séries que a plataforma nos oferece, encontramos os “Originais Netflix”, que estão sendo feitos numa velocidade absurda e, em sua maioria, são de ótima qualidade. Okja é uma dessas produções magníficas trazidas até nós recentemente, e merece ser vista por crianças, adultos e velhinhos.

Não assisti muitos filmes dirigidos por Bong até o momento. Antes de Okja, me encantei única e exclusivamente por Expresso do Amanhã (Snowpiercer, 2013), adaptação de uma graphic novel francesa, lindamente executada pelo cineasta sul-coreano; mas já posso ser ousada e dizer que, baseando-me neste curto histórico, tenho boas expectativas quanto à experiências futuras de filmes com os quais este homem se envolva direta ou indiretamente, pois tanto Expresso do Amanhã quanto Okja me fizeram levitar!

Como não dar credibilidade à um conto que tem como foco este animal fictício adorável que nos emociona, nos faz sorrir e chorar e querer protegê-lo da crueldade sem limites de uma sociedade egoísta e gananciosa? Trata-se de uma obra sobre amizade verdadeira, a defesa de seres que não podem fazê-lo sozinhos, o amor incondicional pela natureza – politizado porém sensível, alarmante porém questionador, tudo em um só pacote.

3. Grave (Raw, dir. Julia Ducournau)

Ocasionalmente, nos deparamos com surpresas cinematográficas tão bacanas! E eu, pra ser bem sincera, nem sou tão difícil de agradar quando o assunto é entretenimento, já que procuro manter minha mente aberta ao me sentar para assistir algo. No entanto, tem sido tempos difíceis, até mesmo pra mim, que não sou exigente.

É por isso que Grave, dirigido pela francesa Julia Ducournau, foi uma descoberta tão agradável em 2017. Há alguns meses, eu cliquei o botão “play” de Raw despretensiosamente, ignorante sobre o enredo, sem conhecer os atores, nunca tendo ouvido falar da roteirista relativamente desconhecida, que traz o total de cinco filmes em seu currículo e, na minha opinião, vai longe.

Vale considerar que, nos dias de hoje, uma ideia original é praticamente banhada a ouro. Numa era em que os remakes estão em alta e a maioria das pessoas não parece se importar com um suspense bem feito, apenas com o famoso e decadente “jump-scare”, é revigorante quando alguém traz à mesa uma ideia antiga, com uma abordagem fresca. A pegada de Grave é simultaneamente realista e fantasiosa. Para quem gosta do gênero de horror, é um prato cheio: sangrento na medida certa, com momentos desconfortáveis de acompanhar, de modo que você acaba se colocando no lugar daqueles indivíduos, se perguntando o que faria se fosse eles. Ah, e o desfecho vai te deixar de boca aberta, palavra de escoteiro!

2. mãe! (mother!, dir. Darren Aronofsky)

Primeiro, um conselho: não assista mãe! se você está buscando uma forma de distração leve. Este filme, definitivamente, não foi feito apenas para nos distrair e traz muitas características em sua descrição, e “leveza” não é uma delas. Tenho a impressão de que o novo trabalho de Aronofsky enganou muita gente este ano, pois seu trailer atraiu uma manada de desavisados que foram ao cinema esperando algum tipo de suspense moderno para matar algumas horas do fim de semana e acabou sendo atacado por um carro alegórico subversivo, surreal e, em vários momentos, agressivo na sala do cinema.

A agressividade de mãe! é uma esfera mutante e crescente, apresentando trivialidades intrincadas em metáforas bem elaboradas que podem ou não ser claras no decorrer da narrativa. A construção da história inicia-se na calmaria de uma vida a dois, transformando-se em um furacão multifacetado num piscar de olhos. Senti meu coração bater forte enquanto as situações atingiam níveis perturbadores sem prévio aviso, e dependiam da minha vontade em entender e solucionar suas camadas – tarefa um tanto árdua, admito, mas que valeu a pena.

Sem mais delongas, acredito que o diretor de Réquiem Para Um Sonho (Requiem For A Dream, 2000) e Cisne Negro (Black Swan, 2010), mais uma vez, homenageou a persistência, a sobrevivência agridoce e a dor aguda de ser que beiram a obsessão, nos desafiando a encarar uma miríade de questões profundas, cena por cena, ao cutucar feridas sociais, ambientais e espirituais num conto de fadas sombrio que vai além do que nossos olhos são capazes de enxergar.

1. A Ghost Story (A Ghost Story, dir. David Lowery)

Quantas vezes ao dia você “julga um livro pela capa”? Mais cliché, impossível, eu sei, mas ecoa inúmeras atitudes reais, certo? Avistei o pôster de A Ghost Story enquanto passeava pela Grã Bretanha este ano e o mesmo me pareceu uma piada sem graça de Halloween; ao ler a sinopse fajuta (todas elas são fajutas diga-se de passagem, nem sei por que me deixei manipular), decidi que “nããão, não vou perder meu tempo”, e fui ver outro filme naquela tarde.

O tempo passou, voltei de viagem, o longa metragem de Lowery nunca estreou no Brasil e eis que, meses depois, trombei num link online do filme e quando dei por mim, havia acabado de presenciar uma obra de tirar o fôlego de tão intensa e delicada, repleta de dilemas silenciosos e musicalidade metafísica. Ainda preciso mencionar que me arrependi profundamente por tê-lo julgado por conta da simplicidade de seu pôster?

Sim, A Ghost Story é um filme deveras simples em diversos pontos: o ritmo lento da história, os diálogos mínimos e corriqueiros, a exatidão exaustiva dos frames. Por outro lado, a complexidade de sua fábula vai além da camada espessa e encardida do lençol branco que cobre o rosto de um morto nos contando sua história por telepatia. Adivinha! Acabei me dando conta de que viver é uma constante telepatia. Padecer é telepatia. Morrer é telepatia. Sentimentos são telepáticos, apesar da extensa lista de vocábulos para defini-los – mais do que isso, sentimentos são invisíveis, como imaginamos que fantasmas devem ser, caso eles existam. E quanto ao tempo… Será que ele existe?

Sobre Quênia Lalita 16 Artigos
Quênia Lalita escreve poesia. É ilustradora, tradutora e faz revisão de textos. E mora em São José dos Campos, SP

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