Amar…

Por Milton T. Mendonça

A manhã sufocante emergiu de uma noite úmida e cheia de pesadelos. Viriato se levantou tateando e acendeu a luz. Quinta-feira – pensou – mais um dia e poderei vê-la, precisamos conversar pessoalmente. Chega de e-mail.

Ela raramente respondia seus e-mails, mas se percebia nos poucos enviados que existia um pequeno interesse, se não, uma curiosidade que alimentava o fogo que o consumia. Ela era comprometida, seu companheiro estava fora do país a serviço, talvez não voltasse mais, precisava decidir se ia ao seu encontro ou ficava por aqui. Essa duvida a fragilizava e Viriato não queria usar isso como estratégia para a conquista. Não desejava forçar nada, queria que ela viesse espontaneamente, precisava se sentir escolhido.

Passou o dia angustiado, frenético, mal humorado. Brigou no serviço, xingou o frentista, despediu a faxineira. Estava com os nervos fora de controle, e isso não fazia parte de sua personalidade, sua calma era lendária no seu circulo de amizades.

Aquela noite fora angustiante, cheia de brigas, correrias e procura. Encontrou-a e a perdeu várias vezes. Estava exausto.

Sexta-feira – gritou ao acordar na manha seguinte – repetindo como um alucinado: sexta-feira, sexta-feira, sexta-feira, sentando-se no ladrilho do banheiro com a água batendo no pescoço como um machado sem corte. Elisa…Lisa – chamou baixinho.

Amava-a, tinha certeza. Nunca sentira nada parecido. A necessidade de protegê-la, inclusive de si mesmo, era algo louco. Preferia-a longe a sofrer consigo e, era notória sua capacidade de fazer as mulheres sofrerem. Sentia medo, não sabia amar. Como faze-la feliz se não conseguia fazer feliz nem a si mesmo?

Saiu para o trabalho como um sonâmbulo. O dia transcorreu como sempre, monótono. Apenas aquele medo irracional o acompanhando como uma sombra. A tarde procurou se manter ocupado e, quando finalmente chegou a hora de ir embora, era um homem destroçado pela ansiedade.

Correu para o local do encontro se sentando à mesa mais ao fundo, longe de olhares indiscretos. Sentiu sua presença bem antes de ver seu vulto entrar pela porta. Ela caminhou ereta, com seu vestido vermelho, por entre as mesas. Viriato se levantou assombrado sem conseguir tirar os olhos de sua imagem perturbadora. Cumprimentou-a trêmulo com um beijo no rosto.

Ficaram em silêncio enquanto saboreavam o liquido rosado, se olhando, esperando que o outro tomasse a iniciativa. Seus olhos expressivos sorriram quando encontraram os dele, o contorno oblíquo os tornavam hipnóticos.
– Estou feliz porque veio – sussurrou, encostando-se ao espaldar alto da cadeira.
– Não podia deixar de vir…Você sabe…Tantas coisas precisam ser decididas.
– Eu te amo! – exclamou, se espantando com a própria voz.
Percebeu seus olhos se dilatarem e um sorriso aflorar de sua boca sensual.
– Você sabe o que está dizendo? – levantou a cabeça e mexeu os cabelos, nervosa – não está confundindo desejo com amor?
– Nunca amei antes, mas já senti desejo muitas vezes. O que sinto por você é diferente de tudo. Não sei amar…Mas…Não me pergunte como…Sei que te amo!
Ela passou a ponta da língua lentamente sobre os lábios, os olhos fixos nele. Suas pupilas como duas pérolas negras, o deixaram lívido. Sentia uma intensa emoção em evolução.

Tomou um gole do vinho, baixando os olhos para a toalha bordada, fugindo daquela sensação apavorante de não ter conseguido convence-la de sua sinceridade.
– Não sei amar! Nunca amei e provavelmente farei besteira atrás de besteira. Mas se me der uma chance, prometo fazê-la feliz.
Levantou os olhos a encarando. Prendeu o fôlego temendo o pior, nada mais poderia fazer a não ser esperar.

Um longo silêncio caiu sobre ambos até que Elisa piscou os olhos e exalou o ar com um suspiro profundo. Ela o observou por um minuto, sorriu, tocou sua mão suavemente e exclamou:
– Amar se aprende amando!